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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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DETERMINISMO 246 DETERMINISMO<br />

mental mais adiantada e amadurecida, a física<br />

— que levaram a abandonar aquilo que Clau<strong>de</strong><br />

Bernard chamava <strong>de</strong> "princípio do criterium<br />

experimental". Primeiro a teoria da relativa<strong>de</strong><br />

e <strong>de</strong>pois a mecânica quântica puseram em<br />

crise a noção <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> necessária e, por<br />

conseguinte, a <strong>de</strong> "D. absoluto". Em 1930,<br />

Heisenberg, <strong>de</strong>scobridor do princípio <strong>de</strong> in<strong>de</strong>terminação<br />

(v.) e um dos fundadores da mo<strong>de</strong>rna<br />

física quântica, escrevia: "O conceito <strong>de</strong><br />

universo que <strong>de</strong>riva da experiência quotidiana<br />

foi abandonado pela primeira vez na teoria da<br />

relativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Einstein. Por ela, vê-se que os<br />

conceitos usuais só po<strong>de</strong>m ser aplicados a<br />

acontecimentos nos quais a velocidacie <strong>de</strong> propagação<br />

da luz po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada praticamente<br />

infinita... As experiências com o mundo<br />

atômico obrigam-nos a uma renúncia ainda<br />

mais profunda dos conceitos até agora habituais.<br />

Com efeito, nossa <strong>de</strong>scrição usual da natureza<br />

e, em especial, a idéia <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong><br />

rigorosa nos eventos da natureza repousam na<br />

admissão <strong>de</strong> que é possível observar um fenômeno<br />

sem influenciá-lo <strong>de</strong> modo perceptível...<br />

Na física atômica, porém, a cada observação<br />

geralmente está ligada uma perturbação finita<br />

e até certo ponto incontrolável, o que era <strong>de</strong> se<br />

esperar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o princípio na física das menores<br />

unida<strong>de</strong>s existentes. Como, por outro lado,<br />

toda <strong>de</strong>scrição espácio-temporal <strong>de</strong> um evento<br />

físico está ligada à observação do evento, segue-se<br />

que a <strong>de</strong>scrição espácio-temporal dos<br />

eventos e a lei causai clássica representam dois<br />

aspectos causais que se excluem mutuamente<br />

nos acontecimentos físicos" (Diephysikalischen<br />

Prinzipíen <strong>de</strong>r Quantentheorie, 1930, IV, § 3).<br />

Quase ao mesmo tempo, Max Planck, <strong>de</strong>scobridor<br />

do quantum <strong>de</strong> ação, escrevia que, para<br />

po<strong>de</strong>r salvar a hipótese do D. rigoroso, era<br />

necessário pensar num Espírito I<strong>de</strong>al, capaz <strong>de</strong><br />

abranger todos os processos físicos que se <strong>de</strong>senvolvem<br />

simultaneamente e, portanto, <strong>de</strong><br />

predizer com certeza e em todos os <strong>de</strong>talhes<br />

qualquer processo físico. Naturalmente, do<br />

ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> um espírito <strong>de</strong>sses, o princípio<br />

<strong>de</strong> in<strong>de</strong>terminação, do fato <strong>de</strong> o homem<br />

precisar intervir nos processos naturais para<br />

po<strong>de</strong>r observá-los, não valeria, visto ser ele,<br />

por hipótese, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da natureza (Der<br />

Kausalbegriff in <strong>de</strong>r Physik, 1932, pp. 24-25).<br />

Mas essa hipótese, como é óbvio, não tem nenhum<br />

fundamento científico ou filosófico. De<br />

Broglie, outro protagonista da física contemporânea,<br />

afirmava que os argumentos <strong>de</strong> Von<br />

Neumann (v. CAUSALIDADE) provaram que: "As<br />

leis <strong>de</strong> probabilida<strong>de</strong> enunciadas pela mecânica<br />

ondulatória e quântica sobre os fenômenos<br />

elementares, leis bem provadas pela experiência,<br />

não têm a forma que <strong>de</strong>veriam ter se fossem<br />

<strong>de</strong>vidas à nossa ignorância dos valores<br />

exatos <strong>de</strong> certas variáveis ocultas. O único caminho<br />

que ainda estava aberto ao restabelecimento<br />

do D. em escala atômica parece, portanto,<br />

fechar-se diante <strong>de</strong> nós" (Physique et<br />

Microphysique, X; trad. it., p. 209).<br />

Desse modo, o abandono da causalida<strong>de</strong><br />

necessária e da doutrina do D. absoluto, que<br />

transformara a causalida<strong>de</strong> necessária em princípio<br />

universal do conhecimento científico, parece<br />

sancionado pelas maiores autorida<strong>de</strong>s<br />

científicas do nosso tempo. Todavia, esse abandono<br />

não é, automaticamente, a aceitação do<br />

in<strong>de</strong>terminismo, ou seja, do reconhecimento<br />

do acaso e do arbítrio absoluto nos fenômenos<br />

naturais. Assim como o abandono da noção <strong>de</strong><br />

causa coinci<strong>de</strong> com o uso cada vez mais amplo j<br />

e consciente da noção <strong>de</strong> condição (v.), tam- i<br />

bém o abandono da noção <strong>de</strong> D. absoluto, pa- i<br />

ralela à primeira, coinci<strong>de</strong> com a aceitação <strong>de</strong> i<br />

uma forma <strong>de</strong> D. que se vai esclarecendo pa- j<br />

ralelamente ao esclarecimento do conceito <strong>de</strong> [<br />

condição. Ao <strong>de</strong>clarar inutilizável o conceito j<br />

<strong>de</strong> causa, a física contemporânea insistiu na pos- [<br />

sibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> previsão provável; e ao <strong>de</strong>clarar, I<br />

por isso mesmo, a queda do D. absoluto, ten<strong>de</strong><br />

a adotar um D. restrito ou, como diz o próprio<br />

De Broglie, "fraco" ou "imperfeito", fundado<br />

no reconhecimento <strong>de</strong> que "nem todas as possibilida<strong>de</strong>s<br />

são igualmente prováveis" e <strong>de</strong> que<br />

"todo estado <strong>de</strong> um sistema microscópico comporta<br />

certas tendências que se expressam pelas<br />

diferentes probabilida<strong>de</strong>s das diversas possibilida<strong>de</strong>s<br />

nele contidas" (Ibíd., p. 212). Em sentido<br />

análogo, no domínio das ciências sociais,<br />

Gurvitch falou do D. como <strong>de</strong> uma simples<br />

"contingência coerente" ou "coerência contingente",<br />

que nunca é unívoca, mas sempre se<br />

caracteriza por constituir uma situação intermediária<br />

entre os opostos do contínuo e do <strong>de</strong>scontínuo,<br />

do quantitativo e do qualitativo, do<br />

heterogêneo e do homogêneo, etc. (Déterminismes<br />

sociaux, 1955, pp. 28 ss.). Portanto,<br />

a palavra D. não foi abandonada, mas sofreu<br />

uma transformação radical na linguagem<br />

científica e filosófica contemporânea. Não <strong>de</strong>signa<br />

mais o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong> necessária e<br />

<strong>de</strong> previsão infalível, mas o método <strong>de</strong> conexão<br />

condicional e <strong>de</strong> previsão provável.

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