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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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LIBERDADE 606 LIBERDADE<br />

damentais, correspon<strong>de</strong>ntes a três concepções<br />

que se sobrepuseram ao longo <strong>de</strong> sua história<br />

e que po<strong>de</strong>m ser caracterizadas da seguinte<br />

maneira: l 1 L. como auto<strong>de</strong>terminação ou<br />

autocausalida<strong>de</strong>, segundo a qual a L. é ausência<br />

<strong>de</strong> condições e <strong>de</strong> limites; 2 a L. como necessida<strong>de</strong>,<br />

que se baseia no mesmo conceito<br />

da prece<strong>de</strong>nte, a auto<strong>de</strong>terminação, mas atribuindo-a<br />

à totalida<strong>de</strong> a que o homem pertence<br />

(Mundo, Substância, Estado); 3 a L. como possibilida<strong>de</strong><br />

ou escolha, segundo a qual a L. é limitada<br />

e condicionada, isto é, fínita. Não constituem<br />

conceitos diferentes as formas que a L.<br />

assume nos vários campos, como p. ex. L.<br />

metafísica, L. moral, L. política, L. econômica,<br />

etc. As disputas metafísicas, morais, políticas,<br />

econômicas, etc, em torno da L. são dominadas<br />

pelos três conceitos em questão, aos quais,<br />

portanto, po<strong>de</strong>m ser remetidas as formas específicas<br />

<strong>de</strong> L. sobre as quais essas disputas<br />

versam.<br />

1- Para a primeira concepção, <strong>de</strong> L. absoluta,<br />

incondicional e, portanto, sem limitações<br />

nem graus, é livre aquilo que é causa <strong>de</strong> si<br />

mesmo. Sua primeira expressão encontra-se em<br />

Aristóteles. Embora a análise aristotélica do<br />

voluntarismo das ações pareça recorrer ao conceito<br />

da L. fínita, a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> voluntário é a<br />

mesma <strong>de</strong> L. infinita: voluntário é aquilo que é<br />

"princípio <strong>de</strong> si mesmo". Aristóteles começa<br />

afirmando que a virtu<strong>de</strong> e o vício <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m<br />

<strong>de</strong> nós; e prossegue: "Nas coisas em que a ação<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> nós a não-ação também <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>;<br />

e nas coisas em que po<strong>de</strong>mos dizer não também<br />

po<strong>de</strong>mos dizer sim. De tal forma que, se<br />

realizar uma boa ação <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> nós, também<br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>rá <strong>de</strong> nós não realizar má ação"<br />

(Et. nic, III, 5, 1113 b 10). Isso já fora dito por<br />

Platão no mito <strong>de</strong> Er. Mas para Aristóteles significa<br />

que "o homem é o princípio e o pai <strong>de</strong><br />

seus atos, assim como <strong>de</strong> seus filhos" (Ibid).<br />

De fato, ''só para quem tem em si mesmo seu<br />

próprio princípio, o agir ou o não agir <strong>de</strong>pen<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> si mesmo" (Ibid., III, 1, 1110 a 17); assim o<br />

homem "é o princípio <strong>de</strong> seus atos" (Ibid., III,<br />

3, 1112 b 15-16). Essa noção <strong>de</strong> "princípio <strong>de</strong> si<br />

mesmo" é a <strong>de</strong>finição da lei incondicionada,<br />

encontrada, p. ex., em Cícero: "Para os movimentos<br />

voluntários da alma não se <strong>de</strong>ve procurar<br />

uma causa alheia, pois o movimento está<br />

em nosso po<strong>de</strong>r e <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> nós: nem por isso<br />

é sem causa, visto que sua causa é sua própria<br />

natureza" (Defato, II). Em Epicuro, a noção<br />

<strong>de</strong> L. tinha o mesmo significado <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>-<br />

terminação absoluta, que para ele começava<br />

nos átomos, aos quais atribuía o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>sviar-se<br />

da própria trajetória. Lucrécio diz: "Po<strong>de</strong>mos<br />

<strong>de</strong>sviar nossos movimentos sem sermos<br />

<strong>de</strong>terminados pelo tempo nem pelo lugar, mas<br />

pelo que nos inspira nosso espírito; pois sem<br />

dúvida a vonta<strong>de</strong> é o princípio <strong>de</strong>sses atos e<br />

através <strong>de</strong>la o movimento se expan<strong>de</strong> por todos<br />

os membros" (De rer. nat., II, 260). A noção<br />

<strong>de</strong> L. como autocausalida<strong>de</strong> ou auto<strong>de</strong>terminação<br />

(cxÚTOTtpaYÍa) também é o fundamento<br />

do conceito <strong>de</strong> L. como necessida<strong>de</strong>. Os estóicos<br />

admitiam que eram livres as ações que<br />

têm em si mesmas causa ou princípio: "Só o sábio<br />

é livre, e todos os malvados são escravos,<br />

pois L. é auto<strong>de</strong>terminação, enquanto escravidão<br />

é falta da auto<strong>de</strong>terminação" (DlÓG. L, VII,<br />

121). Epicteto, conseqüentemente, dizia que<br />

eram "livres" as coisas que estão "em nosso po<strong>de</strong>r",<br />

ou seja, os atos do homem que têm princípio<br />

no próprio homem (Dis., I, 1).<br />

Este conceito foi transmitido durante toda a<br />

Ida<strong>de</strong> Média. Orígenes foi o primeiro a <strong>de</strong>fendê-lo<br />

no mundo cristão, esclarecendo-o no<br />

sentido <strong>de</strong> que a L. consiste não só em ter em<br />

si a causa dos próprios movimentos, mas também<br />

em ser essa causa. Esta <strong>de</strong>finição, que se<br />

aplica a todos os seres vivos, privilegia o homem<br />

porque a causa dos movimentos, humanos<br />

é aquilo que o próprio homem escolhe<br />

como móbil, enquanto juiz e árbitro das circunstâncias<br />

externas (Deprinc, III, 5). Consi<strong>de</strong>rações<br />

análogas ocorrem em De libero<br />

arbítrio <strong>de</strong> S. Agostinho (cf., p. ex., I, 12; III, 3;<br />

III, 25). Em outro trecho ele diz: "Sente que a<br />

alma se movimenta por si só quem sente em si<br />

a vonta<strong>de</strong>" (De div. quaesi, 83, 8). Alberto Magno<br />

dizia que era livre o homem que é causa <strong>de</strong><br />

si e que não é coagido pelo po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> outro (S.<br />

Th., II, 16, 1). E, para S. Tomás, "o livre-arbítrio<br />

é a causa do movimento porque pelo livre-arbítrio<br />

o homem <strong>de</strong>termina-se a agir". S. Tomás<br />

acrescenta que, para existir L, não é necessário<br />

que o homem seja a primeira causa <strong>de</strong> si mesmo,<br />

como <strong>de</strong> fato não é, pois a primeira causa<br />

é Deus. Mas a Primeira Causa não impe<strong>de</strong> a<br />

autocausalida<strong>de</strong> do homem (Ibid., I, q. 83, a. 1;<br />

cf. Contra Gent., II, 48). A última escolástica<br />

manteve esse conceito <strong>de</strong> L, aliás acentuando<br />

a indiferença da vonta<strong>de</strong> com relação aos<br />

seus possíveis <strong>de</strong>terminantes. Duns Scot afirma<br />

que "a L. da nossa vonta<strong>de</strong> consiste em po<strong>de</strong>r<br />

<strong>de</strong>cidir-se por atos opostos, seja <strong>de</strong>pois, seja no<br />

mesmo instante" (Op. Ox., I, d. 39, q. 5, n. 16).

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