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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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PENA 750 PENA<br />

pena. "Se uma culpa é cometida" — diz Platão<br />

— "é preciso ir o mais <strong>de</strong>pressa possível aon<strong>de</strong><br />

a P. possa ser cumprida, ou seja, ao juiz, que é<br />

como um médico, para que a doença da injustiça<br />

não se tome crônica e não torne a alma corrompida<br />

e incurável" (Górg., 480 a). Com efeito,<br />

"quem cumpre a P. sofre um bem", no<br />

sentido <strong>de</strong> que "se for punido com justiça, ficará<br />

melhor" e "libertar-se-á do mal" (Ibid., Ali<br />

a); assim, a P. é uma purificação ou libertação<br />

que o próprio culpado <strong>de</strong>ve querer. Essa função<br />

purificadora é muitas vezes reconhecida<br />

por aqueles que vêem na P. o restabelecimento<br />

da justiça. Apesar <strong>de</strong> Kant afirmar que "a P.<br />

nunca po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>cretada como meio para<br />

atingir um bem, seja em proveito do criminoso,<br />

seja em proveito da socieda<strong>de</strong> civilizada, mas<br />

<strong>de</strong>ve ser-lhe aplicada apenas porque ele cometeu<br />

um crime" (Met. <strong>de</strong>rSitten, I, II, seç. 1, E; p.<br />

142), negando assim qualquer conexão entre<br />

as duas concepções <strong>de</strong> P., S. Tomás <strong>de</strong> Aquino<br />

reconhecia essa conexão e dizia: "As P. da vida<br />

presente são medicinais; assim, quando uma P.<br />

não é suficiente para <strong>de</strong>ter um homem, acrescenta-se<br />

outra, como fazem os médicos que<br />

empregam diversos remédios quando um só<br />

não é eficaz" (S. Th., II, 2, q. 39 a. 4, ad 3 y ).<br />

Analogamente, Hegel afirmava que a P. não é<br />

somente a conciliação da lei consigo mesma,<br />

mas também a conciliação do <strong>de</strong>linqüente com<br />

sua lei, com a lei "conhecida e válida para ele,<br />

<strong>de</strong>stinada à sua proteção"; nessa conciliação, o<br />

<strong>de</strong>linqüente encontra "a satisfação da justiça e<br />

o seu próprio interesse" (Fil. do dir., § 220).<br />

3 Q A terceira concepção <strong>de</strong> P. atribui-lhe a<br />

função <strong>de</strong> <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r a socieda<strong>de</strong>. Deste ponto<br />

<strong>de</strong> vista, a P. é: a) um móvel ou estímulo para a<br />

conduta dos cidadãos; b) uma condição física<br />

que põe o <strong>de</strong>linqüente na impossibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

prejudicar. Os filósofos acentuaram sobretudo<br />

o primeiro caráter. Aristóteles já notava que todos<br />

aqueles que não tiveram a sorte <strong>de</strong> receber<br />

da natureza uma índole liberal (e são os mais<br />

numerosos) abstêtn-se dos atos vergonhosos<br />

só por medo das penas. E diz: "A maioria obe<strong>de</strong>ce<br />

mais à necessida<strong>de</strong> que à razão, mais às P.<br />

cjue à honra" (Et. nic, X, 9. 11 80 a 4; cf. 1179 b<br />

11). Mas o que Aristóteles consi<strong>de</strong>rava o móvel<br />

das almas servis a concepção aqui examinada<br />

consi<strong>de</strong>rava o móvel único e fundamental.<br />

Hobbes afirma que "é ineficaz a proibição que<br />

não venha acompanhada pelo temor da P., sendo,<br />

pois, ineficaz uma lei que não contenha<br />

ambas as partes, a que proíbe <strong>de</strong> cometer um<br />

<strong>de</strong>lito e a que pune quem o comete" (De eive.<br />

1642, XIV, § 7). Este conceito seria adotado<br />

pela <strong>filosofia</strong> jurídica do lluminismo. É retomado<br />

por Samuel Pufendorf, que atribui à P. a<br />

tarefa principal "<strong>de</strong> dissuadir os homens do<br />

pecado com seu rigor" (De jure naturae, 1672,<br />

VIII, 3, 4), sem excluir, todavia, a correção do<br />

réu (Ibid.. VIII, 3, 9). Mas foi com Cesare Beccaria<br />

que esse conceito prevaleceu: fundamentou<br />

sua obra Dei dititti e <strong>de</strong>llepene (1764). Segundo<br />

Beccaria, a P. não passa <strong>de</strong> motivo sensível<br />

para reforçar e garantir a ação das leis, <strong>de</strong> tal<br />

maneira que "as penas que excedam da necessida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> conservar a saú<strong>de</strong> pública são injustas<br />

por natureza" (Dei dirittí e <strong>de</strong>lle pene, § 2).<br />

Do mesmo ponto <strong>de</strong> vista, Bentham consi<strong>de</strong>rava<br />

a P. como uma entre as várias espécies <strong>de</strong><br />

sanções(y.) cuja função é servir <strong>de</strong> "estimulantes<br />

da conduta humana", porquanto "transferem<br />

a conduta e suas conseqüências para a<br />

esfera das esperanças e dos temores: esperanças<br />

<strong>de</strong> um exce<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> prazeres; temores<br />

que prevêem por antecipação um exce<strong>de</strong>nte<br />

<strong>de</strong> dores" (Deontology, 1834, I, 7). Os<br />

mesmos conceitos fundamentais foram validados<br />

pela <strong>de</strong>nominada "Escola Positiva Italiana"<br />

(Lombroso. Ferri e outros), que os <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>u<br />

com certo sucesso na discussão filosófico-jurídica<br />

a respeito do direito penal.<br />

Não há dúvida <strong>de</strong> que a maioria dos juristas,<br />

dos filósofos do direito, dos códigos e dos direitos<br />

positivos vigentes nas várias nações do<br />

mundo inspiram-se numa concepção mista ou<br />

eclética da P., consi<strong>de</strong>rando-a, na maioria das<br />

vezes, sob os três ângulos aqui apresentados.<br />

Este sincretismo não cria nenhuma dificulda<strong>de</strong><br />

do ponto <strong>de</strong> vista teórico, ainda que os três<br />

pontos <strong>de</strong> vista não tenham o mesmo grau <strong>de</strong><br />

homogeneida<strong>de</strong>. Os primeiros dois unem-se<br />

facilmente e também na prática estão freqüentemente<br />

juntos, enquanto o terceiro pertence a<br />

uma or<strong>de</strong>m diferente <strong>de</strong> pensamento: os dois<br />

primeiros inspiram-se na ética dos fins; o outro,<br />

na ética do móvel (v. ÉTICA). Mas as dificulda<strong>de</strong>s<br />

começam no terreno prático, quando é<br />

preciso estabelecer a medida da pena. Neste<br />

campo, as três concepções manifestam heterogeneida<strong>de</strong>.<br />

De acordo com o primeiro ponto<br />

<strong>de</strong> vista, todas as infrações à or<strong>de</strong>m da justiça<br />

são equivalentes: um furto insignificante fere<br />

essa or<strong>de</strong>m tanto quanto um crime perpetrado<br />

com frau<strong>de</strong> e violência. De acordo com o segundo<br />

ponto <strong>de</strong> vista, somos levados a crer<br />

qtie a pena, assim como um purgativo, é mais

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