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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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ALMA 30 ALMA<br />

intelectiva "uma forma imaterial e incorruptível<br />

que está por inteiro em todo o corpo e por<br />

inteiro em cada parte, não se po<strong>de</strong> conhecer<br />

com evidência, nem com a razão nem com a<br />

experiência, que tal A. seja forma do corpo e<br />

que o entendimento seja próprio <strong>de</strong> semelhante<br />

substância". De fato, as razões que se po<strong>de</strong>m<br />

aduzir para a <strong>de</strong>monstração <strong>de</strong> tal forma são<br />

dúbias; e, quanto à experiência, tudo o que<br />

experimentamos são a intelecção, a volição,<br />

etc.: operações que po<strong>de</strong>m muito bem ser próprias<br />

<strong>de</strong> uma "forma extensa, generável e<br />

corruptível", isto é, do próprio corpo. Por isso,<br />

Ockham relega a matérias <strong>de</strong> fé não só a imortalida<strong>de</strong><br />

da A. (como já havia feito Scot), mas a<br />

própria realida<strong>de</strong> da A. intelectiva como suposto<br />

sujeito das operações espirituais <strong>de</strong> que<br />

temos experiência. Essa negação baseia-se precisamente<br />

na experiência que se tem dos próprios<br />

atos espirituais (intelectivos e volitivos),<br />

experiência que, para Ockham, é um conhecimento<br />

intuitivo e <strong>de</strong> natureza espiritual {cognitio<br />

intuitiva intellectivá), pelo qual estão imediatamente<br />

presentes, na sua singularida<strong>de</strong> e nas<br />

suas relações recíprocas, os atos ou as operações<br />

espirituais (In Sent., prol. q. 1; Quodl., I,<br />

q. 14; II, 1. 12). — Com essas observações, o<br />

conceito <strong>de</strong> experiência interna, diferente da<br />

experiência sensível ou externa, era introduzido<br />

na história da <strong>filosofia</strong>, precisamente quando<br />

a realida<strong>de</strong> a que tal experiência <strong>de</strong>veria<br />

dar acesso, isto é, a realida<strong>de</strong> da A., era posta<br />

em dúvida. Com Descartes, a experiência interna<br />

<strong>de</strong>veria tornar-se o ponto <strong>de</strong> partida da<br />

<strong>filosofia</strong> mo<strong>de</strong>rna.<br />

A noção <strong>de</strong> A. como substância sobrevive à<br />

crise do Renascimento. Nem mesmo o materialismo<br />

<strong>de</strong> Telésio e o <strong>de</strong> Hobbes constituem<br />

negações propriamente ditas da substancialida<strong>de</strong><br />

da alma. Telésio admite uma substância<br />

intelectiva, diretamente criada e infundida por<br />

Deus no homem, só para explicar a vida religiosa<br />

do homem, a sua aspiração ao transcen<strong>de</strong>nte<br />

(De rer. nat., V, 2); mas o mesmo "espírito<br />

animal", <strong>de</strong> que ele se vale para explicar a<br />

sensibilida<strong>de</strong>, a inteligência e até a vida moral<br />

do homem, embora sendo <strong>de</strong> natureza corpórea<br />

e produzido pelo sêmen, é por ele consi<strong>de</strong>rado<br />

como realida<strong>de</strong> em si, como "substância" (ibid.,<br />

V, 10). Quanto a Hobbes, <strong>de</strong>clara ilegítima a<br />

transição operada por Descartes da proposição<br />

"Sou uma coisa que pensa", que é indubitável,<br />

à proposição "Sou uma substância pensante",<br />

já que não é necessário que a coisa que pensa<br />

seja pensamento, mas po<strong>de</strong> ser o próprio corpo<br />

(/// Objections, 2). Mas a interpretação materialista<br />

não nega que a alma seja uma "coisa",<br />

isto é, uma "realida<strong>de</strong>".<br />

No que diz respeito à noção <strong>de</strong> alma no<br />

mundo mo<strong>de</strong>rno, o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong>cisivo<br />

ocorre com Descartes, em cuja doutrina a reafirmação<br />

da realida<strong>de</strong> da A. une-se ao reconhecimento<br />

<strong>de</strong> uma via <strong>de</strong> acesso privilegiada a tal<br />

realida<strong>de</strong>. Essa via <strong>de</strong> acesso é o pensamento,<br />

ou melhor, a consciência (v.). O cogito ergo<br />

sum revela <strong>de</strong> modo evi<strong>de</strong>nte, segundo Descartes,<br />

a substância pensante, isto é, revela "um<br />

ser, cuja existência nos é mais conhecida do<br />

que a dos outros seres, <strong>de</strong> modo que po<strong>de</strong><br />

servir como princípio para conhecê-los" (Lett. à<br />

Clercelier, em (Euvres, IV, 443). Ora, o cogito<br />

compreen<strong>de</strong> "tudo o que está em mim e <strong>de</strong> que<br />

sou imediatamente consciente" (IIRép., <strong>de</strong>f. I):<br />

isto é, duvidar, compreen<strong>de</strong>r, conceber, afirmar,<br />

negar, querer, não querer, imaginar, sentir,<br />

etc. Assim, a consciência é uma via <strong>de</strong> acesso<br />

privilegiada — porque tão segura, a ponto<br />

<strong>de</strong> ser absolutamente indubitável — a uma realida<strong>de</strong>,<br />

a substância A., que, por sua vez, também<br />

é privilegiada porque po<strong>de</strong> servir como<br />

princípio para conhecer as outras realida<strong>de</strong>s. E<br />

<strong>de</strong> fato é a própria consciência, enquanto testemunha<br />

do caráter passivo da faculda<strong>de</strong> sensível,<br />

que faz pensar em uma substância ou<br />

realida<strong>de</strong> diferente da A., que aja sobre a A.,<br />

isto é, em uma substância corpórea ou extensa,<br />

certificada pelo princípio da veridicida<strong>de</strong><br />

divina. Desse modo, Descartes <strong>de</strong>terminou a<br />

virada subjetivista na interpretação da A. como<br />

substância. Para ele, os atributos da A. continuam<br />

sendo os tradicionais, como simplicida<strong>de</strong>,<br />

in<strong>de</strong>strutibilida<strong>de</strong>, unida<strong>de</strong>, etc. Mas a via <strong>de</strong><br />

acesso à realida<strong>de</strong> da A. tem o privilégio <strong>de</strong> ser<br />

a mais certa porque possui a certeza do cogito.<br />

Comparada a esta, a certeza das outras coisas,<br />

isto é, das substâncias extensas, é secundária e<br />

<strong>de</strong>rivada, porque mediada pela consciência. —<br />

Ora, essa colocação domina todas as doutrinas<br />

mo<strong>de</strong>rnas. Spinoza e Leibniz traduzem o conceito<br />

cartesiano da A. nos termos <strong>de</strong> seus conceitos<br />

<strong>de</strong> realida<strong>de</strong>. Para Spinoza, a A. é "a idéia<br />

<strong>de</strong> um corpo singular existente em ato" (Et., II,<br />

11): é a consciência correlativa a um corpo<br />

orgânico. Não se po<strong>de</strong> dizer que a A. seja substância<br />

porque a substância é uma só, Deus.<br />

Mas, como idéia, a A. é parte do intelecto infinito<br />

<strong>de</strong> Deus, isto é, uma manifestação necessária<br />

da substância divina (ibid., II, 9), portanto

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