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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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CAUSALIDADE 127 CAUSALIDADE<br />

cognoscível apriori, isto é, <strong>de</strong>dutível, a existência<br />

e os caracteres da própria coisa. Quando<br />

Leibniz diz que a natureza <strong>de</strong> uma "substância<br />

individual" basta "para compreen<strong>de</strong>r e para<br />

permitir a <strong>de</strong>dução <strong>de</strong> todos os predicados do<br />

sujeito ao qual é atribuída" (Discours <strong>de</strong> métaphysique,<br />

§ 8), está consi<strong>de</strong>rando essa natureza<br />

como a razão ou a causa dos caracteres e da<br />

existência da substância individual, que po<strong>de</strong>m<br />

ser conhecidos apriori, isto é, <strong>de</strong>duzidos<br />

a partir <strong>de</strong>la. Nessas observações <strong>de</strong> Leibniz exprime-se<br />

com toda a clareza a exigência que<br />

Aristóteles já havia proposto: <strong>de</strong> que a causa, e<br />

em particular a "causa primeira" (no sentido<br />

aristotélico, não no medieval), constitua o princípio<br />

da <strong>de</strong>dução <strong>de</strong> todos os seus efeitos possíveis<br />

(v. FUNDAMENTO).<br />

Esse conceito persiste na <strong>filosofia</strong> mo<strong>de</strong>rna,<br />

sendo compartilhado tanto pelas doutrinas<br />

i<strong>de</strong>alistas ou aprioristas quanto pelas doutrinas<br />

materialistas e mecanicistas. Fichte i<strong>de</strong>ntifica a<br />

C. com a ativida<strong>de</strong> criativa do eu infinito que se<br />

explica e se realiza segundo uma necessida<strong>de</strong><br />

racional absoluta (Wissenscbaftslebre, 1794,<br />

§ 4, C-D). Hegel consi<strong>de</strong>ra a C. como a própria<br />

substância "enquanto refletida em si" (Ene,<br />

5153), isto é, mergulhada em sua necessida<strong>de</strong>.<br />

"A causa per<strong>de</strong>-se no seu outro, o efeito; a<br />

ativida<strong>de</strong> da substância causai per<strong>de</strong>-se no<br />

seu operar", diz ele (Wissenschaft <strong>de</strong>rLogík, III,<br />

2, 1 B). Mas a substância causai é a própria razão,<br />

isto é, a realida<strong>de</strong> em sua essência <strong>de</strong>scerrada.<br />

Nessas notas, a C. é i<strong>de</strong>ntificada com a racionalida<strong>de</strong><br />

substancial do mundo ou é consi<strong>de</strong>rada<br />

uma parte, um momento ou uma manifestação<br />

<strong>de</strong>ssa racionalida<strong>de</strong>. Serve ora para <strong>de</strong>finir<br />

a natureza da racionalida<strong>de</strong>, ora para ser <strong>de</strong>finida<br />

por ela. Hegel, tomando como ponto <strong>de</strong><br />

partida o étimo da palavra Ursache (causa),<br />

vê nela a "coisa originária" (Ene, § 153), isto é,<br />

a coisa que é a origem ou o princípio das outras<br />

ou <strong>de</strong> que as outras <strong>de</strong>rivam, ou seja, <strong>de</strong>rivam<br />

racionalmente, <strong>de</strong> tal modo que constituem,<br />

junto com ela, o sistema total da razão. Aqui, o<br />

sentido atribuído à C. é o <strong>de</strong> racionalida<strong>de</strong> pura<br />

e o sentido atribuído à racionalida<strong>de</strong> é o <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>dutibilida<strong>de</strong> necessária. A relação causai é<br />

uma relação <strong>de</strong> <strong>de</strong>dução. Da causa <strong>de</strong>ve-se<br />

po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>duzir o efeito, e se <strong>de</strong>duz efetivamente.<br />

Mais ou menos no mesmo período, os cientistas<br />

elaboravam, com base na explicação mecânica<br />

do mundo, um conceito <strong>de</strong> C. análogo<br />

ao <strong>de</strong> Hegel, isto é, coinci<strong>de</strong>nte com ele na sua<br />

natureza <strong>de</strong> relação <strong>de</strong> <strong>de</strong>dutibilida<strong>de</strong>. O astrô-<br />

nomo Laplace assim exprimia o i<strong>de</strong>al da explicação<br />

causai na sua Teoria analítica das probabilida<strong>de</strong>s,<br />

<strong>de</strong> 1812. "Nós <strong>de</strong>vemos consi<strong>de</strong>rar<br />

o estado presente do universo como efeito<br />

do seu estado anterior e como causa do que se<br />

seguirá. Uma inteligência que, em dado instante,<br />

conhecesse todas as forças <strong>de</strong> que a natureza<br />

é animada e a situação respectiva dos seres<br />

que a compõem, se fosse bastante vasta para<br />

submeter esses dados ao cálculo, abarcaria na<br />

mesma fórmula os movimentos dos maiores<br />

corpos do universo e os do átimo mais leve:<br />

nada seria incerto para ela e o futuro, assim<br />

como o passado, estaria diante <strong>de</strong> seus olhos".<br />

Tais palavras permaneceram como a insígnia<br />

da ciência do século XIX e exprimem claramente<br />

o estreito nexo que a interpretação racionalista<br />

da C. estabeleceu, a partir <strong>de</strong> Descartes, entre<br />

a C. e a previsão infalível, e entre a previsão<br />

infalível e a <strong>de</strong>dução apriori. Elas exprimem,<br />

<strong>de</strong> fato, um i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> saber que possa prever<br />

qualquer acontecimento futuro, seja ele pequeno<br />

ou gran<strong>de</strong>, <strong>de</strong>duzindo-o por meio <strong>de</strong> leis<br />

imutáveis e necessárias. Alguns <strong>de</strong>cênios mais<br />

tar<strong>de</strong>, Clau<strong>de</strong> Bernard, em sua Introdução ao<br />

estudo da medicina experimental (1865), obe<strong>de</strong>cendo<br />

ao mesmo i<strong>de</strong>al, excluía a possibilida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> que a ciência, mesmo na sua exigência<br />

radical <strong>de</strong> crítica, viesse a duvidar do princípio<br />

causai, por ele chamado <strong>de</strong> princípio do <strong>de</strong>terminismo<br />

absoluto. "O princípio absoluto das<br />

ciências experimentais", dizia (Introduction, I,<br />

2, 7), "é um <strong>de</strong>terminismo necessário e consciente<br />

nas condições dos fenômenos. Se ocorre<br />

um fenômeno natural, seja ele qual for, um<br />

experimentador nunca po<strong>de</strong>rá admitir que haja<br />

uma variação na expressão <strong>de</strong>sse fenômeno,<br />

sem que, ao mesmo tempo, tenham sobrevindo<br />

condições novas em sua manifestação: além<br />

disso, ele tem a certeza a priori <strong>de</strong> que essas<br />

variações são <strong>de</strong>terminadas por relações rigorosas<br />

e matemáticas. A experiência mostra-nos<br />

somente a forma dos fenômenos, mas a relação<br />

<strong>de</strong> um efeito com uma causa <strong>de</strong>terminada<br />

é necessária e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte da experiência, e<br />

forçosamente matemática e absoluta". Mas,<br />

apesar <strong>de</strong>ssas afirmações tão <strong>de</strong>cididas <strong>de</strong> um<br />

dos maiores cientistas e metodologistas da<br />

ciência do séc. XIX, a própria ciência seguiu<br />

outro curso, no que se refere à elaboração e ao<br />

uso da noção <strong>de</strong> causalida<strong>de</strong>. Os progressos do<br />

cálculo das probabilida<strong>de</strong>s, <strong>de</strong> algumas teorias<br />

físicas (especialmente a teoria cinética dos gases),<br />

e da mecânica quântica foram <strong>de</strong>stinando

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