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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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LIBERDADE 607 LIBERDADE<br />

Esta possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir-se por atos opostos<br />

expressa a perfeita indiferença da vonta<strong>de</strong><br />

com relação a todas as motivações possíveis.<br />

Ockham, mesmo negando a possibilida<strong>de</strong> simultânea<br />

<strong>de</strong> atos opostos, também frisa a indiferença<br />

absoluta da vonta<strong>de</strong>: "Por L enten<strong>de</strong>se<br />

o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>, indiferente e contingentemente,<br />

propor coisas diferentes, <strong>de</strong> tal forma que posso<br />

causar ou não o mesmo efeito, sem que haja<br />

diversida<strong>de</strong> alguma, a não ser nesse po<strong>de</strong>r"<br />

(Qiiodl., I, q. 16). Mas Ockham não julga que<br />

seja possível <strong>de</strong>monstrar que a vonta<strong>de</strong> é livre<br />

nesse sentido. A L. só po<strong>de</strong> ser conhecida por<br />

experiência, pois "o homem sente que, mesmo<br />

que a razão lhe dite alguma coisa, a vonta<strong>de</strong><br />

po<strong>de</strong> querê-la ou não" (Ibid., I, cj. 16). Buridan<br />

observava a esse respeito que a L. não consiste<br />

em po<strong>de</strong>r <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> seguir o juízo do intelecto,<br />

porque, se o intelecto reconhecesse com evidência<br />

que dois bens são perfeitamente iguais,<br />

não po<strong>de</strong>ria <strong>de</strong>cidir-se nem por nenhum dos<br />

dois; consiste, sim, em po<strong>de</strong>r suspen<strong>de</strong>r ou<br />

impedir o juízo do intelecto (In Hth., III, q. 1-4).<br />

E assim propunha as premissas do caso que se<br />

<strong>de</strong>nominou O As.no <strong>de</strong> Buridan (v.): este, por<br />

não ter L, morre <strong>de</strong> fome na mesma condição<br />

em que o homem po<strong>de</strong> suspen<strong>de</strong>r o juízo e<br />

fazer arbitrariamente a escolha.<br />

O conceito <strong>de</strong> autropraguia ou causa sui<br />

ocorre com freqüência na <strong>filosofia</strong> mo<strong>de</strong>rna e<br />

contemporânea. "A substância livre" — diz<br />

Leibniz — "<strong>de</strong>termina-se por si mesma, seguindo<br />

o motivo do bem que é percebido pela inteligência,<br />

que a inclina sem necessitá-la: todas<br />

as condições da L estão compreendidas nestas<br />

poucas palavras" (Théod., III, § 288). Este mesmo<br />

conceito levou Kant a admitir o caráter "numênico"<br />

da liberda<strong>de</strong>: "Se tivermos <strong>de</strong> admitir a L.<br />

como proprieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> certas causas dos fenômenos,<br />

ela <strong>de</strong>ve, em relação aos fenômenos<br />

como eventos, ter a faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> iniciar por si<br />

isponte) a série <strong>de</strong> seus efeitos, sem que a ativida<strong>de</strong><br />

da causa precise ter início e sem que seja<br />

necessária outra causa que <strong>de</strong>termine tal início"<br />

(Prol, § 53). A ''faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> iniciar por si um<br />

evento" é exatamente a causa sui do conceito<br />

tradicional <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong>. Esta é também <strong>de</strong>nominada,<br />

no mesmo sentido, "espontaneida<strong>de</strong><br />

absoluta', ou seja, ativida<strong>de</strong> que não recebe<br />

outra <strong>de</strong>terminação senão <strong>de</strong> si mesma (Crít. R.<br />

Pura, I. livro I, cap. III, Elucidação crítica). Mas,<br />

mesmo como causa sui ou espontaneida<strong>de</strong> absoluta,<br />

"a causa livre, em seus estados, não<br />

po<strong>de</strong> ser submetida a <strong>de</strong>terminações <strong>de</strong> tempo.<br />

não <strong>de</strong>ve ser um fenômeno, <strong>de</strong>ve ser uma<br />

coisa em si e só os seus efeitos <strong>de</strong>vem ser julgados<br />

fenômenos" (Prol, § 53). Kant quis<br />

conciliar a L. humana, como po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> auto<strong>de</strong>terminação,<br />

com o <strong>de</strong>terminismo natural que,<br />

para ele, constitui a racionalida<strong>de</strong> da natureza;<br />

por isso consi<strong>de</strong>rou a L. como númeno, pois<br />

aquilo que, <strong>de</strong> um ponto <strong>de</strong> vista (dos fenômenos),<br />

po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado necessida<strong>de</strong>, <strong>de</strong><br />

outro ponto <strong>de</strong> vista (do númeno), po<strong>de</strong> ser<br />

consi<strong>de</strong>rado L. Mas o conceito <strong>de</strong> L. não sofreu<br />

inovação alguma com esse artifício kantiano.<br />

Esse mesmo conceito é expresso por Fichte: "A<br />

absoluta ativida<strong>de</strong> também é <strong>de</strong>nominada L. A<br />

L. é a representação sensível da auto-ativida<strong>de</strong>"<br />

(Sittenlehre, Intr., 7, em Werke, IV, p. 9).<br />

Esse mesmo conceito está hoje presente em<br />

todas as formas <strong>de</strong> in<strong>de</strong>terminismo (v.). Nas<br />

formas espiritualistas do in<strong>de</strong>terminismo (que<br />

são as mais difundidas), a auto<strong>de</strong>terminação é<br />

consi<strong>de</strong>rada uma experiência interior fundamental,<br />

uma espécie <strong>de</strong> criação "interior"; torna-se<br />

a "autocriação do eu". Maine <strong>de</strong> Biran<br />

afirma: ''A L. ou a idéia <strong>de</strong> L, tomada em sua<br />

fonte real, nada mais é que o sentimento que<br />

temos <strong>de</strong> nossa ativida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong>sse po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />

agir, <strong>de</strong> criar o esforço constitutivo do eu"<br />

(Essai sur les fon<strong>de</strong>ments <strong>de</strong> Ia psychologie,<br />

1812, em (Euvres, ed. Naville, I, p. 284). Concepção<br />

análoga po<strong>de</strong> ser encontrada em Mikrokosmus<br />

<strong>de</strong> Lotze (1, pp. 283 ss.) e, com alguma<br />

atenuação, em Nouvelle monadologie, <strong>de</strong><br />

Renouvier (pp. 24 ss.). O espiritualismo francês,<br />

com Sécretan, Ravaísson, Lachelíer, Boutroux,<br />

Hamelin, atém-se estritamente a esse<br />

mesmo conceito. "O conhecimento das leis das<br />

coisas" — diz Boutroux — "permite-nos dominá-las<br />

e assim, em vez <strong>de</strong> prejudicar nossa L, o<br />

mecanismo torna-a eficaz." Portanto, não somente<br />

as coisas internas, como queria Epicteto,<br />

mas também as externas <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m <strong>de</strong> nós (De<br />

Vidée <strong>de</strong> loi naturelle, 1895, pp. 133, 143). Desse<br />

ponto <strong>de</strong> vista, o motivo não é a causa<br />

necessitante da ação humana: a vonta<strong>de</strong> dá<br />

preferência a um motivo mais que a outro, e o<br />

motivo mais forte não o é in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente<br />

da vonta<strong>de</strong>, mas sim em virtu<strong>de</strong> <strong>de</strong>la (f.a<br />

contingence <strong>de</strong> loís <strong>de</strong> Ia nature, 1874, p. 124).<br />

O conceito bergsoniano <strong>de</strong> L. outra coisa não<br />

faz senão reexpor essa mesma tese. Bergson<br />

afirma que o conceito <strong>de</strong> L. por ele <strong>de</strong>fendido<br />

situa-se entre a noção <strong>de</strong> L. moral, isto é, da<br />

"in<strong>de</strong>pendência da pessoa perante tudo o que<br />

não é ela mesma", e a noção cie livre-arbítrio,

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