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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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SENTIMENTO 875 SENTIMENTO<br />

vai <strong>de</strong> Pascal aos moralistas franceses e ingleses<br />

(La Rochefoucauld, Vauvenargues, Shaftesbury<br />

e Hume) e chega até Rousseau e Kant,<br />

culminando neste último: essa é a linha que levou<br />

à elaboração do conceito mo<strong>de</strong>rno cie paixão<br />

como emoção dominante e à noção <strong>de</strong><br />

gosto (v.) que está intimamente relacionada<br />

com a <strong>de</strong> sentimento. "S.", "coração", "espírito<br />

<strong>de</strong> fineza" foram expressões usadas por Pascal<br />

para indicar o princípio ou o órgão das emoções,<br />

que é diferente do órgão ou do princípio<br />

dos raciocínios e irredutível a este. Pascal diz:<br />

"Os que estão acostumados a julgar com o S.<br />

nada enten<strong>de</strong>m das coisas cio raciocínio porque<br />

logo querem penetrar a questão com um<br />

lance <strong>de</strong> olhos, <strong>de</strong>sacostumados que estão a<br />

buscar princípios. Os outros, ao contrário, que<br />

estão acostumados a raciocinar por princípios,<br />

nada enten<strong>de</strong>m das coisas do S., porque buscam<br />

princípios, e não po<strong>de</strong>m apreendê-los<br />

apenas com um lance <strong>de</strong> olhos" (Pensões, 3).<br />

Ao S. ou ao coração <strong>de</strong>ve-se a mesma certeza<br />

que têm os primeiros princípios do raciocínio<br />

("Os princípios são sentidos, as proposições<br />

são <strong>de</strong>duzidas, e em cada uma <strong>de</strong>ssas duas formas<br />

há certeza, embora obtida por caminhos<br />

diferentes'); ao S. e ao coração 6 atribuída a<br />

verda<strong>de</strong>ira religiosida<strong>de</strong>, da qual o raciocínio<br />

po<strong>de</strong> somente aproximar-se e da qual só po<strong>de</strong><br />

dar expectativas (Ibid.. 282). Assim, os moralistas<br />

ingleses e franceses acima citados contribuíram<br />

para a elaboração e o reconhecimento da<br />

categoria do sentimento, por terem acentuado o<br />

papel dominante das emoções na vida do homem.<br />

Finalmente, é preciso lembrar que a "volta<br />

à natureza", proclamada por Rousseau como<br />

meio capaz <strong>de</strong> libertar o homem dos males<br />

produzidos pelos artificialismos sociais e <strong>de</strong><br />

reconduzi-lo à bonda<strong>de</strong> original, é entendida<br />

por ele como volta ao primitivo S. natural. O S.<br />

natural é um instinto, uma tendência originária<br />

que o conduz para o bem; quando não é alterada,<br />

afetada ou bloqueada, conserva o homem<br />

no bem e no bem permite-lhe progredir. Nestas<br />

famosas teses <strong>de</strong> Rousseau talvez se encontre a<br />

primeira aparição da categoria do S. como princípio<br />

autônomo da vida espiritual. Mas o primeiro<br />

a falar em termos filosóficos sobre essa<br />

categoria e a incluí-la numa nova subdivisão<br />

dos pocleres ou das faculda<strong>de</strong>s espirituais foi<br />

provavelmente Kant. Enquanto Wolff (e <strong>de</strong>pois<br />

<strong>de</strong>le os wolffianos) admitia somente duas ativida<strong>de</strong>s<br />

fundamentais do espírito humano, conhecimento<br />

e volição, objetos dos dois ramos<br />

fundamentais da <strong>filosofia</strong>, o teórico e o prático,<br />

KANT reconheceu um terceiro po<strong>de</strong>r ou faculda<strong>de</strong>,<br />

o sentimento. "Todos os po<strong>de</strong>res ou faculda<strong>de</strong>s<br />

da alma — diz KANT (Crít. do Juízo, Intr..<br />

§ III) — po<strong>de</strong>m ser reduzidos a três, que não<br />

são redutíveis a um princípio comum: o po<strong>de</strong>r<br />

cognitivo, o S. do prazer e da dor e o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sejar." O S. <strong>de</strong> prazer ou dor <strong>de</strong>ve ser inserido<br />

entre o po<strong>de</strong>r cognitivo e o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> <strong>de</strong>sejar;<br />

a ele cabe um princípio autônomo, que<br />

Kant chama <strong>de</strong> faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> juízo (v.). Assim,<br />

o S. 6 o campo <strong>de</strong> crítica da faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> juízo,<br />

assim como a faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>sejar 6 o campo<br />

<strong>de</strong> crítica da razão prática. Kant caracteriza o S.<br />

como o aspecto irredutivelmente subjetivo da<br />

representação. Diz (Ibid., § VII): "Aquilo que<br />

há <strong>de</strong> subjetivo numa representação e que não<br />

po<strong>de</strong> <strong>de</strong> modo algum tornar-se artigo <strong>de</strong> conhecimento<br />

é o prazer ou a dor que estão ligados<br />

á representação; isso porque através <strong>de</strong>les<br />

nada conheço do objeto da representação, ainda<br />

que eles possam ser efeito <strong>de</strong> algum conhecimento."<br />

Em conformida<strong>de</strong> com esta reivindicação<br />

cie autonomia do S. como categoria<br />

espiritual, em sua Antropologia pragmática,<br />

Kant divi<strong>de</strong> a primeira parte, <strong>de</strong>dicada ao "modo<br />

<strong>de</strong> conhecer interior e exterior do homem",<br />

em três livros, <strong>de</strong>dicados respectivamente ao<br />

po<strong>de</strong>r cognitivo, ao S. cie prazer e dor e ao<br />

po<strong>de</strong>r apetitivo. Por sua vez, o segundo livro<br />

é dividido em duas partes principais, a primeira<br />

das quais <strong>de</strong>dicada ao "S. <strong>de</strong> <strong>de</strong>leite e<br />

prazer sensível na sensação do objeto"; a segunda,<br />

<strong>de</strong>dicada ao "S. do belo, que é em parte<br />

sensível e em parte intelectual, sendo próprio<br />

da intuição reflexa ou do gosto". Esta segunda<br />

parte resume <strong>de</strong> forma mais acessível os resultados<br />

da Critica do Juízo; a primeira contém<br />

uma série <strong>de</strong> observações sobre o S. <strong>de</strong> prazer<br />

e dor em relação com os dados dos sentidos<br />

(cf. também Met. <strong>de</strong>r Sitten, Intr. 1, nota) (v.<br />

EMOÇÃO).<br />

Com isso, o S. ingressara oficialmente na <strong>filosofia</strong><br />

como categoria in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte. O próprio<br />

Hegel aceita-o como <strong>de</strong>terminação do<br />

espírito subjetivo e <strong>de</strong>fine-o como ''uma afeição<br />

<strong>de</strong>terminada", mas <strong>de</strong>terminada <strong>de</strong> modo<br />

simples, isto é, <strong>de</strong> tal modo cjue, mesmo<br />

quando seu conteúdo é sólido e verda<strong>de</strong>iro (o<br />

que nem sempre acontece), ele assume a forma<br />

<strong>de</strong> "particularida<strong>de</strong> aci<strong>de</strong>ntal". Hegel acrescenta:<br />

"Quando, ao discutir sobre uma coisa,<br />

alguém não recorre à natureza e ao conceito da<br />

coisa, ou pelo menos à razão e à universalida-

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