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Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

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SENTIMENTO 877 SENTIMENTO<br />

naturalista e psicológico": noção que várias vezes<br />

exerceu função negativa e crítica em estética,<br />

historiografia, lógica e ética, pois contrapunha<br />

às interpretações <strong>de</strong>masiado limitadas e<br />

estreitas tudo o que havia <strong>de</strong> "in<strong>de</strong>terminado"<br />

ou "semi<strong>de</strong>terminado" fora <strong>de</strong>ssas interpretações.<br />

O testemunho a que recorria para rejeitar<br />

essa categoria é o da observação interior:<br />

"Quem quiser, investigue seu espírito e tente<br />

indicar um ato sequer que, ao contrário dos<br />

indicados acima latos teóricos e práticos], constitua<br />

algo novo e original, e mereça a <strong>de</strong>nominação<br />

especial <strong>de</strong> S." (Fil. da pratica, I, I, c. 2).<br />

Mas esse tipo <strong>de</strong> testemunho é extremamente<br />

variável e infenso a qualquer verificação; para<br />

Fries, p. ex., e para muitos outros, a distinção<br />

entre S. e outras ativida<strong>de</strong>s espirituais era tão<br />

claramente provada pelo testemunho interior<br />

quanto <strong>de</strong>smentida para Croce. Na realida<strong>de</strong>, o<br />

uso <strong>de</strong> tais categorias, como S., ativida<strong>de</strong> teórica,<br />

ativida<strong>de</strong> prática, só po<strong>de</strong> ser discutido,<br />

portanto submetido a limites e regras, com base<br />

na análise precisa <strong>de</strong> um grupo <strong>de</strong>limitável <strong>de</strong><br />

fenômenos: análise que Croce nem sequer tentou.<br />

Contudo, na <strong>filosofia</strong> contemporânea não<br />

faltam análises <strong>de</strong>sse tipo, que figuram entre<br />

suas contribuições menos discutíveis para o conhecimento<br />

do homem em seu mundo. Uma<br />

<strong>de</strong>ssas contribuições — das mais importantes<br />

— é a <strong>de</strong> Max Scheler, que se referiu às palavras<br />

<strong>de</strong> Pascal, "o coração tem razões que a razão<br />

<strong>de</strong>sconhece", mas sem interpretá-las no<br />

sentido freqüentemente encontrado na <strong>filosofia</strong><br />

mo<strong>de</strong>rna e contemporânea (v. CORAÇÃO), <strong>de</strong><br />

que a razão <strong>de</strong>veria ter certa con<strong>de</strong>scendência<br />

para com o S. e tentar correspon<strong>de</strong>r às suas<br />

exigências, porém no sentido <strong>de</strong> que o S. tem<br />

suas próprias leis, seus próprios objetos e constitui,<br />

portanto, um mundo diferente do racional.<br />

Scheler começa fazendo a distinção entre<br />

os estados emotivos simples, que não têm caráter<br />

intencional, ou seja, que não se referem<br />

imediatamente a um objeto próprio (v. EMO-<br />

ÇÃO), e o S. originário e intencional, que, ao<br />

contrário, é uma reação particular ao estado<br />

emotivo e consiste nas atitu<strong>de</strong>s extremamente<br />

variáveis e mutáveis assumidas diante do estado<br />

emotivo: enfrentar, tolerar, fruir, suportar,<br />

etc. Estado emotivo, p. ex., é o prazer sensível<br />

correspon<strong>de</strong>nte ao caráter agradável <strong>de</strong> uma<br />

refeição, um perfume, um leve toque. O S.<br />

puro, ao contrário, consiste nas reações do eu a<br />

tal estado emotivo: p. ex., fruir em maior ou<br />

menor grau, tolerar, etc. Assim, enquanto um<br />

estado emotivo faz parte do conteúdo fenomenal,<br />

o S. puro está entre as funções <strong>de</strong>stinadas a<br />

apreen<strong>de</strong>r tiú conteúdo. Desse ponto <strong>de</strong> vista,<br />

a tendência a suportar ou a fruir nada tem a ver<br />

com a sensibilida<strong>de</strong> em relação ao prazer e à<br />

dor. O grau <strong>de</strong> prazer ou <strong>de</strong> dor po<strong>de</strong> ser o<br />

mesmo, mas o sofrimento e o gozo por eles<br />

provocados em dois indivíduos ou no mesmo<br />

indivíduo em momentos diferentes po<strong>de</strong>m ser<br />

completamente diferentes. Ora, enquanto os<br />

estados emotivos po<strong>de</strong>m ser relacionados apenas<br />

<strong>de</strong> modo indireto com os objetos ou os fatos<br />

<strong>de</strong> que são efeito ou sinal, os sentimentos<br />

puros referem-se imediatamente a um objeto<br />

específico, que é o valor. Portanto, a relação<br />

entre S. e valor é a mesma observada entre a<br />

representação e seu objeto: a relação intencionaliv.<br />

INTENCIONALIDADK). Enquanto é necessário<br />

um ato <strong>de</strong> reflexão para relacionar um estado<br />

emotivo com o objeto <strong>de</strong> que é sinal ou que<br />

julgamos ter provocado, o S. relaciona-se com<br />

seu objeto específico, o valor, <strong>de</strong> modo imediato,<br />

como acontece, p. ex., quando sentimos<br />

a beleza dos montes cobertos <strong>de</strong> neve ao pôrdo-sol.<br />

A conexão intencional entre S. e valor<br />

não tem, pois, nada a ver com um vínculo causai<br />

entre S. e objeto, e in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> também da<br />

causalida<strong>de</strong> psíquica individual, ou seja, das<br />

leis que regem a vida psíquica do indivíduo. De<br />

fato, quando as exigências dos valores não são<br />

satisfeitas, sofremos, p. ex., por não nas sentirmos<br />

tão alegres quanto o valor <strong>de</strong> um acontecimento<br />

mereceria, ou por não nos sentirmos<br />

tão tristes pela morte <strong>de</strong> um ente querido quanto<br />

esse fato exigiria (Formalismus, pp. 260 ss.).<br />

Assim, segundo Scheler, o S. dá acesso a um<br />

mundo <strong>de</strong> objetos tão reais quanto as coisas ou<br />

os fatos que constituem o objeto da representação,<br />

mas que nada têm a ver com eles, porque<br />

não são coisas nem fatos, mas valores. Scheler,<br />

portanto, está <strong>de</strong> acordo com Kant ao julgar<br />

que o S. não é "artigo <strong>de</strong> conhecimento", mas<br />

discorda <strong>de</strong>le quanto a julgar que ele não tem<br />

nenhum objeto e é, por isso, <strong>de</strong>stituído <strong>de</strong> caráter<br />

intencional. Apenas as emoções sensíveis<br />

são <strong>de</strong>stituídas <strong>de</strong> objeto e por isso constituem<br />

estados emotivos puros, ao passo que os sentimentos<br />

vitais e os psíquicos sempre po<strong>de</strong>m<br />

revelar caráter intencional (referir-se a um objeto-valor);<br />

os S. espirituais revelam-no necessariamente<br />

(para a distinção entre os graus emocionais,<br />

V. EMOÇÃO). A análise <strong>de</strong> Scheler é muito<br />

importante porque lança novas luzes sobre a<br />

vida emocional do homem. Contudo, o próprio

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