22.06.2013 Views

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

Dicionario de filosofia.pdf - Charlezine

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

CAUSALIDADE 128 CAUSALIDADE<br />

um espaço cada vez maior à noção <strong>de</strong> probabilida<strong>de</strong>;<br />

finalmente, a mecânica quântica ten<strong>de</strong> a<br />

substituir a noção <strong>de</strong> C, que parecia indispensável<br />

aos cientistas e metodologistas do século<br />

passado, pela <strong>de</strong> probabilida<strong>de</strong>. Po<strong>de</strong>-se dizer<br />

que a última manifestação filosófica da teoria<br />

clássica da C. é a doutrina <strong>de</strong> Nicolai Hartmann,<br />

que, embora consi<strong>de</strong>rando a realida<strong>de</strong> dividida<br />

em planos estratificados, cada um dos quais<br />

obe<strong>de</strong>ce a um seu <strong>de</strong>terminismo próprio, mo<strong>de</strong>la<br />

cada tipo ou forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminismo sobre<br />

a C. necessária da física oitocentista, entendida,<br />

na sua forma mais rigorosa, como negação<br />

<strong>de</strong> qualquer possibilida<strong>de</strong> ou liberda<strong>de</strong> (Móglichkeit<br />

und Wirklichkeit, 1938).<br />

2- A segunda forma que a noção <strong>de</strong> C. assumiu<br />

na história é a que a reduz substancialmente<br />

à relação <strong>de</strong> previsibilida<strong>de</strong> certa. As críticas<br />

que, <strong>de</strong> raro em raro, a noção <strong>de</strong> C. encontrou<br />

na <strong>filosofia</strong> antiga ten<strong>de</strong>m a reduzir essa noção<br />

à <strong>de</strong> sucessão ou <strong>de</strong> conexão cronológica constante,<br />

base <strong>de</strong> previsibilida<strong>de</strong> dos eventos.<br />

Assim, o filósofo árabe Al Gazali (séc. XI), no<br />

intuito <strong>de</strong> reservar o po<strong>de</strong>r causai só para<br />

Deus, negando-o nas coisas, observou que o<br />

vínculo verificável entre as coisas é certo nexo<br />

temporal e que, p. ex., dizemos que a combustão<br />

é causada pelo fogo unicamente porque<br />

ocorre junto com o fogo (AVERRÓIS, Destructio<br />

<strong>de</strong>structionum, I, dúv. 3)- Com outro intuito,<br />

Ockham, no séc. XIV, antecipava a crítica <strong>de</strong><br />

Hume afirmando que o conhecimento <strong>de</strong> uma<br />

coisa não traz consigo, a nenhum título, o conhecimento<br />

<strong>de</strong> uma coisa diferente, <strong>de</strong> tal<br />

modo que "uma proposição como 'o calor esquenta'<br />

<strong>de</strong> forma alguma po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>monstrada<br />

por silogismo, mas o seu conhecimento só<br />

po<strong>de</strong> ser obtido por experiência, pois se não se<br />

experimentar que, em presença <strong>de</strong> calor, segue-se<br />

o calor em uma outra coisa, não se po<strong>de</strong><br />

saber que calor produz calor mais do que se<br />

sabe que brancura produz brancura" (Summa<br />

log., III, 2, 38). Aqui se antecipa claramente o<br />

ponto fundamental da crítica <strong>de</strong> Hume, isto é, a<br />

não-<strong>de</strong>dutibilida<strong>de</strong> do efeito a partir da causa.<br />

Hume começa negando justamente que entre<br />

causa e efeito haja tal relação.<br />

"Nós nos iludimos", diz Hume, "crendo que,<br />

se fôssemos trazidos <strong>de</strong> repente a este mundo,<br />

po<strong>de</strong>ríamos imediatamente <strong>de</strong>duzir que uma<br />

bola <strong>de</strong> bilhar po<strong>de</strong> comunicar movimento a<br />

uma outra". Mas na realida<strong>de</strong>, mesmo supondo<br />

que nasça em mim, por acaso, o pensamento<br />

<strong>de</strong> que o movimento da segunda bola é resul-<br />

tado do choque entre as duas, eu po<strong>de</strong>ria conceber<br />

a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> outros mil acontecimentos<br />

diferentes, como p. ex. que ambas as<br />

bolas permanecessem paradas ou que a primeira<br />

voltasse para trás em linha reta ou escapasse<br />

por um dos lados, em uma direção qualquer.<br />

Todas essas suposições são coerentes e<br />

concebíveis; e aquela que a experiência <strong>de</strong>monstra<br />

ser verda<strong>de</strong>ira não é mais coerente<br />

nem concebível do que as outras. A conclusão<br />

é: "todos os nossos raciocínios apriori não po<strong>de</strong>rão<br />

<strong>de</strong>monstrar nenhum direito a essa preferência";<br />

e "seria inútil tentar predizer qualquer<br />

acontecimento, ou inferir alguma causa ou efeito,<br />

sem o auxílio da observação e da experiência"<br />

(Jnq. Cone. Un<strong>de</strong>rst., IV, 1). A observação e<br />

a experiência, porém, com a repetição <strong>de</strong> certos<br />

acontecimentos similares, isto é, com as<br />

uniformida<strong>de</strong>s que revelam, dão origem ao hábito<br />

<strong>de</strong> crer que tais uniformida<strong>de</strong>s se verificarão<br />

também no futuro e que, portanto, possibilitam<br />

a previsão sobre a qual se baseia a vida<br />

cotidiana. Mas essa previsão, segundo Hume,<br />

não é justificada por nada. Mesmo <strong>de</strong>pois da<br />

experiência vivida, a conexão entre causa e<br />

efeito continua arbitrária (já que causa e efeito<br />

continuam sendo dois acontecimentos distintos),<br />

<strong>de</strong> tal modo que continua sendo arbitrária<br />

a previsão baseada nesse nexo. "O pão que eu<br />

comia antes me alimentava; isto é, um corpo<br />

com certas qualida<strong>de</strong>s sensíveis era dotado <strong>de</strong><br />

forças secretas naquele tempo; mas então será<br />

lícito concluir que um outro pão <strong>de</strong>ve nutrir-me<br />

também em outro tempo e que qualida<strong>de</strong>s sensíveis<br />

semelhantes <strong>de</strong>vam ser sempre acompanhadas<br />

por idênticas forças secretas? A conseqüência<br />

não parece absolutamente necessária"<br />

(Ibid., IV, 2). A conclusão <strong>de</strong> Hume é que a<br />

relação causai é injustificável e que a crença<br />

nela só po<strong>de</strong> ser explicada pelo instinto, isto é,<br />

pela necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> viver que a requer. Essa<br />

análise <strong>de</strong> Hume propôs o problema da C. na<br />

forma que este mantém ainda na <strong>filosofia</strong> contemporânea.<br />

O critério usado por Hume, para<br />

<strong>de</strong>monstrar a insuficiência da teoria clássica, é<br />

o da previsibilida<strong>de</strong>. A relação causai <strong>de</strong>ve tornar<br />

previsível o efeito, mas nenhuma <strong>de</strong>dução<br />

apriori po<strong>de</strong> tornar previsível um efeito qualquer;<br />

por isso, a <strong>de</strong>dução é incapaz <strong>de</strong> fundamentar<br />

a relação causai. A repetição, empiricamente<br />

observável, <strong>de</strong> conexão entre dois<br />

eventos é, então, o único fundamento para afirmar<br />

uma relação causai, e o modo como ela<br />

possibilita essa asserção é o problema que hoje

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!