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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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que o próprio sujeito imigrante faz questão de esquivar. Em Emigrantes, o personagem<br />

Afonso, após o navio Darro aportar em Santos, comunica ao protagonista Manuel que ele<br />

ansiava desembarcar para poder imediatamente assumir a sua posição de imigrante, ou seja,<br />

incorporar-se ao trabalho, evitando qualquer distração ou perda de tempo que emperrasse o<br />

seu projeto de enriquecimento através do trabalho denodado: “Os da primeira vão já para a<br />

cidade. Como se não fôssemos todos iguais! Dizem que nos sustentam, que nos dão casa...<br />

Mas o que eu queria era ir já para terra. Vim para trabalhar e não para perder tempo. Bom;<br />

adeus, senhor Manuel! Mais uma vez... Passe bem! Seja feliz!” (Castro, [1928] 1954: 113).<br />

Na narrativa do desembarque frisa-se como a transformação em agentes da<br />

produção no país de acolhida era um desejo catártico que ineria o afastamento e a<br />

superação das disposições relativas às trajetórias pretéritas truncadas:<br />

Ruidosas, enchendo de brancura a escada trémula, as polacas passaram lestamente de uma<br />

embarcação para a outra e atrás delas seguiram os galegos, desempenhados, respirando saúde e<br />

decisão. [...] E na terceira tudo dir-se-ia provisório: diminuído o rebanho, os que ficaram, italianos,<br />

alguns galegos, cinco portugueses, uma dezena de mulheres, tinham a atitude de quem espera a saída<br />

de um funeral, para dar nova arrumação à vida, para estabelecer nova ordem (Castro, [1928] 1954:<br />

113-117).<br />

O masoquismo do imigrante<br />

A adaptação, aplicada ao imigrante, possui uma denotação bastante ambígua. O<br />

ajuste, a adequação ou a acomodação, por parte do trabalhador alienígena, aos costumes<br />

dos naturais em troca de permissividade e amparo e, inclusive, fraternidade, pode implicar a<br />

sua submissão, isto é, a servidão voluntária, a clássica expressão do séc. XVI para a<br />

interpretação da condição humana criada por Etienne de La Boétie em De la servitude<br />

volontaire ou contr'un, desenvolvida, retraduzindo-a psicanaliticamente como “pacto<br />

masoquista”, por Joel Birman (2006) no seu trabalho sobre o campo do mal-estar na<br />

contemporaneidade intitulado Arquivos do mal-estar e da resistência.<br />

Ora, a adoção de uma disposição submissa pelo estrangeiro imigrante, e a<br />

conseqüente sujeição deste às normativas e a modelos de condutas do país receptor,<br />

dependeria tanto da sua vontade de ser percebido pelos aborígines como um ente aceitável,<br />

ou mesmo admirável, por se ter revestido de características comportamentais semelhantes<br />

às nacionais do país de imigração, quanto da autoridade simbólica e do poder coercitivo da<br />

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