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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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edundante. Assim como esse hipotético jornalista, o sujeito residente em um país que não é<br />

o seu sempre poderá encontrar outros espíritos afins – outros estrangeiros – que entendam o<br />

que ele expressa, porém para esses pares a comunicação das observações nada proporciona,<br />

pois o que um outro estrangeiro expressar já foi sentido ou compreendido por eles,<br />

deixando, logo, de ter qualquer efeito de revelação ou de visão distintiva. Por sua vez, a<br />

autonomia alcançada pelo estrangeiro durante o seu nomadismo é inútil se a liberdade<br />

conseqüente não pode ser utilizada para fim nenhum a não ser a de continuar sendo nômade<br />

e, em parte, ermitão. Trata-se de uma liberdade total, mas absurda; ela representa a<br />

inexistência de limites para o seu exercício e, sendo total, encerra a dissolução do sentido<br />

do seu gozo. O absoluto da liberdade é o tédio, já que a disposição suprema do sujeito sobre<br />

si mesmo relega-o à solidão. Não ter pátria, quer dizer, ter abandonado a própria sem<br />

assumir como substituta a dos outros, liberta o estrangeiro de compromissos e de<br />

obrigações morais, mas também provoca a angústia da orfandade, própria dos apátridas.<br />

Julia Kristeva (1994: 18) afirma que “o estrangeiro é um sonhador que faz amor<br />

com a própria ausência, um deprimido extravagante” de quem é difícil julgar se é feliz. A<br />

dificuldade para julgar o grau de satisfação do estrangeiro com o seu estatuto reside na<br />

disposição dele, inerente à estratégia da neutralidade, para não manifestar desilusão. Se ele<br />

não acredita nem na possibilidade de sucesso, nem no sentido da sua empreitada no<br />

exterior, ele também não crê na sua derrota, porque por nada luta ao não valer a pena o<br />

esforço no espeço da desolação, assumindo, desse modo, a postura distanciada e desligada<br />

do ironista. Mas, caso o estrangeiro acredite no sentido da sua busca em uma terra<br />

prometida, ele prefere, em vez de parar, refletir e investir o seu tempo na expressão da sua<br />

amargura ou do seu ceticismo, porfiar na consecução da fortuna. E essa teima mantém-se<br />

mediante o trabalho. No discurso de Kristeva observa-se que ela insere, ao igual que Sayad,<br />

o estrangeiro trabalhador – o imigrante – em uma estrutura de distribuição da força de<br />

trabalho na qual ele é contrastado com as posições e disposições dos trabalhadores nativos:<br />

Enquanto os nativos do mundo civilizado, dos países adiantados, acham o labor vulgar e assumem os<br />

ares aristocráticos da desenvoltura e do capricho (quando podem...), você reconhecerá o estrangeiro<br />

pelo fato de que ele ainda considera o trabalho como um valor. Certamente uma necessidade vital, o<br />

único meio da sua sobrevivência, que ele não coroa necessariamente de glória, mas reivindica<br />

simplesmente como um direito básico, grau zero da dignidade. Ainda que alguns, uma vez satisfeito<br />

o mínimo, também sintam uma felicidade aguda em se afirmarem no trabalho e pelo trabalho: como<br />

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