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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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humanos. Portanto, Silveira acredita que se deve exigir responsabilidades aos homens de<br />

letras pelo que eles escrevam. Esta é a sua conclusão:<br />

O Brasil perdeu há muito tempo a sua velha tranqüilidade vegetal de fazenda continental para<br />

transformar-se num campo perigoso de ações partidárias. O sangue começa a correr por debaixo das<br />

nossas palavras. Estamos nos aproximando de terríveis julgamentos através dos quais a democracia<br />

será purificada. O homem de letras não poderá mais escapar das suas opiniões. Cada um responderá<br />

pelas suas palavras... (Silveira, 1956: 152).<br />

Logo de O homem de letras será julgado, no capítulo As unhas do gato Pío Baroja,<br />

Silveira apresenta o seu semblante sobre Baroja. Nele recomenda aos brasileiros a leitura da<br />

produção desse escritor, faz alguns apontamentos biográficos sobre ele em que inclui<br />

anedotas e frisa que as relações entre os produtores literários são as próprias de um campo<br />

de lutas. Ele encerra o capítulo expondo a sua surpresa pelo escasso conhecimento que<br />

havia no Brasil desse escritor basco:<br />

Acho estranho que o seu nome não seja bastante conhecido no Brasil, apesar de estarmos tão<br />

próximos da Argentina, onde ele conta com público tão numeroso. Pío Baroja, ao contrário de Blasco<br />

Ibáñez que, mais que escritor literário, foi um repórter oportunista, não desaparecerá nunca da<br />

memória da posterioridade. A sua obra é sólida e vencerá sempre o tempo, que, na poesia gongórica<br />

de Castro Alves: – É a traça que medra, nos livros feitos de pedra!... (Silveira, 1956: 160).<br />

Silveira enuncia também a sua opinião a respeito de uma representação criada na<br />

Europa sobre os brasileiros, consistente na identificação deles com o café e com o lirismo,<br />

esta última, aliás, poderia ser, inclusive, aplicada a todos os ibero-americanos. Essa opinião<br />

de Silveira teria sido conseqüência do seu encontro casual com Pío Baroja, quem lhe seria<br />

apresentado por um seu amigo – o suposto pintor espanhol Antonio Guerrandi – em uma<br />

tarde de novembro de 1938, em um bistrô de Paris. Eis o relato desse encontro:<br />

Já estávamos a encostar os copos nos lábios, quando vimos transpor a porta do botequim um velhote<br />

ensacado num desbotado sobretudo cor de barro, com a cabeça tapada por uma boina basca. O meu<br />

amigo deixou de repente o copo sobre o zinco do balcão e virando-se paea mim, exclamou: – Es D.<br />

Pío, caramba! [...] Desajeitado diante da frialdade do velhote para com o meu amigo, estendi-lhe a<br />

mão um tanto receoso. Pío Baroja olhou-me de alto a baixo e resolveu, por muito favor, descerrar os<br />

lábios e mover o cavaignac: – Es Vd. español? – No señor – respondi-lhe em castelhano – soy<br />

brasileño. Esteve uns minutos encarando-me com certa displicência, e, depois, comentou distraído: –<br />

Ah! sí, brasileño! Mucho café en su país? nosotros aquí, bebiendo ese líquido humorístico color de<br />

chistera vieja... Brasileiro e café, para o europeu, são vocábulos sinônimos. Eu e café, para Pío<br />

Baroja, era a mesma coisa. Mas, a conversa estava emperrada. Continuava, entretanto, a examinar o<br />

velhote. Depois, atacou-me com esta pergunta irônica: – Es Vd. poeta? Estremeci todo, ao sentir-me<br />

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