26.03.2015 Views

UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

como imigrante lhe resulta detestável, terá que reconhecer que é um malfadado ou um<br />

masoquista por tê-la assumido e nela permanecer.<br />

A imigração apresenta também vantagens. Caso o imigrante se recuse a reconhecêlas,<br />

e só sinta desvantagens, tingirá a sua vida de sem-sentido. Sayad (1998: 225-26) expõe<br />

que o emigrante/ imigrante depara-se com um modus vivendi investido de funções<br />

ambivalentes. Esse modus vivendi é delimitado por duas diretrizes contraditórias: o sujeito<br />

migrante, assim como não pode (nem quer) detestar deliberada e absolutamente a sua<br />

emigração/ imigração, descobre que também não pode (nem quer) amá-la absolutamente.<br />

Nesse modus vivendi – nesse sistema de dupla referência –, os mesmos fatos da experiência<br />

podem ser avaliados, segundo a perspectiva adotada, de forma oposta, invocando-os ora<br />

para estigmatizar a emigração e os emigrantes, ora para louvá-la e louvá-los e exaltar o país<br />

de imigração e tudo o que a ele está associado 92 .<br />

92 É claro que as preocupações em torno do estabelecimento de posicionamentos verazes para a indagação das<br />

causas da realidade e a compreensão dos efeitos que a partir dela se produzem são uma constante filosófica.<br />

Desde que a ciência almeja o conhecimento das origens, das formas e do modo como foram feitas as coisas,<br />

visa-se a construção de vias condutoras para alcançar adequadamente esse conhecimento. Assim, o<br />

ajustamento entre o conhecimento e a realidade, o discernimento ao redor das aparências dessa realidade e o<br />

entendimento da relação guardada entre as estruturas cognitivas e o mundo organizado por elas têm sido<br />

motivos de constantes reflexões tendentes a encaixar ou adaptar a identidade do ente, e da sua comunidade, no<br />

âmbito, criado por eles mesmos, do qual fazem parte. Para Paul Watzlawick (1994), da sua ótica cética<br />

enquadrada no construtivismo radical e alicerçada nas conclusões do idealismo, a realidade não existe fora do<br />

conhecimento, ou seja, não existe separação entre objeto e sujeito; seria, então, preciso partir de um realismo<br />

metafísico para entender a realidade ontológica. Assim, o domínio – a compreensão – do que existe é<br />

essencial para a sobrevivência, mas limita-se às analogias e às recursividades que se possam compor da<br />

identidade individual do sujeito pensante. Isso provoca que se formulem, em um sonho de complacência,<br />

profecias que se autocumprem. Afirma Watzlawick (1994: 42): “Lá como cá, trata-se de uma questão de<br />

ponto de vista, ou seja, o que se considera e em relação com o que se busca ‘semelhança’. Supondo que a<br />

matéria-prima da experiência seja abundante, uma consciência assimiladora pode construir regularidades e<br />

ordem também num mundo completamente caótico, desordenado. Até que ponto é isso possível, depende<br />

mais dos fins e do ponto de partida já construído do que das condições dadas do mundo ‘verdadeiro’.” Como<br />

não existe separação entre sujeito e objeto, o objeto padece a heteronomia marcada pela auto-reflexividade do<br />

sujeito. Nesse sentido, Watzlawick (1994: 323) acredita que Francisco Varela, no seu Cálculo de autoreferência,<br />

que parte da lógica de Brown, chegou a conclusões análogas às suas: “O ponto de partida desse<br />

cálculo [...] é o postulado de uma diferenciação. Com esse ato primeiro de divisão separamos umas das outras<br />

as formas dos fenômenos que logo consideramos como o mundo mesmo. Partindo dessa posição, afirmamos<br />

posteriormente a primazia do papel do observador que estabelece suas diferenciações a seu talante. No<br />

entanto, essas distinções que, por um lado, engendram nosso mundo revelam, por outro, exatamente isto: as<br />

distinções que fazemos, e estas se referem mais ao ponto de vista do observador que à verdadeira índole do<br />

mundo, o qual permanece sempre inabarcável por causa da cisão entre observador e observado. Enquanto<br />

percebemos o mundo de determinada maneira de ser, esquecemos o que fizemos para encontrá-lo nesse seu<br />

modo de ser; e, quando remontamos à primeira posição, já não encontramos mais do que a imagem reflexa de<br />

nosso eu no mundo e como mundo. Contrariamente à opinião largamente difundida, a criteriosa investigação<br />

de uma observação revela os traços do observador. Nós, os observadores, nos diferenciamos exatamente em<br />

virtude da diferenciação do que, pelo visto, não somos, isto é, em virtude do mundo”. O habitus que subjaze<br />

ao planejamento de Watzlawick remete, parcialmente, à relação orteguiana entre a razão vital e a captação da<br />

151

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!