26.03.2015 Views

UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

administração do prefeito, adepto da nova ditadura” (Araújo, 1987: 74). No inquérito, o<br />

autor será questionado sobre a sua relação com D. Ramón, assegurando-lhe o delegado que<br />

D. Ramón vivia. O autor não acredita até que, estando na cela, em um intervalo entre o<br />

interrogatório e as torturas, escutou que se procedia a fuzilar um sujeito chamado Ramón<br />

Fernández y Fernández, de nacionalidade “galego espanhol”, cujo cadáver logo é jogado na<br />

cela em que ele penava. Esse fato motiva os dois derradeiros parágrafos da novela:<br />

Curto espaço decorreu desde o instante macabro. Novo burburinho se fez ouvir no pátio, logo um<br />

chape-chape de botas militares sobre as pedras, cada vez mais perto. Abriu-se a grade da solitária,<br />

acendeu-se a lâmpada. Seis soldados entraram, trazendo nos ombros o corpo do meu amigo. À frente,<br />

paramentado com estola e sobrepeliz por cima de negra batina, vinha o capelão militar lendo, baixo,<br />

o breviário. Depuseram o corpo no frio cimento do piso, bem no centro da cela. Se alguma dúvida<br />

ainda me sobrasse, a partir daquele momento, à voz que ouvira, viera juntar-se o rosto tão conhecido,<br />

ao meu alcance, a menos de dois metros do meu. Era ele. Era a segunda e verdadeira morte do<br />

republicano Ramón Fernández y Fernández. Uma terceira, uma quarta, uma nona, uma centésima<br />

teria que haver, se necessária à vontade do carrasco, já lhe haviam advertido no passado.<br />

Retiraram-se todos, sem alarde, como tinham entrado, deixado o cadáver na cela. De novo o chapechape<br />

no pátio. A grade permaneceu aberta, mas assim não ficou muito tempo. Apareceu o Dr.<br />

Clóvis para cerrá-la, estender a cortina e desligar a lâmpada. Trevas e solidão. Dobrei os joelhos para<br />

dizer a oração que o Filho ensinou. Foi o que vi. Quando me libertei, compreendi tudo. “É necessário<br />

pensar. É necessário pensar... Se não pensas, não serás homem”, foram as primeiras palavras que don<br />

Ramón me dirigiu” (Araújo, 1987: 78-79).<br />

Comprova-se que em Vida, paixão e morte republicana de Don Ramón Fernández y<br />

Fernández Nélson de Araújo documentou-se exaustivamente para a composição dos<br />

cenários e para a caracterização dos tipos salvadorenses. Ele dedica a novela “À memória<br />

de Eduardo López y López, republicano”, presumível substrato do protagonista. No<br />

entanto, Nélson de Araújo não tinha ascendência galega. O professor, jornalista, literato e<br />

editor Nélson Correia de Araújo (4 de setembro de 1926 – 7 de abril de 1993) nasceu em<br />

Capela, município do Estado de Sergipe; só na década de 1940 foi residir em Salvador,<br />

onde faleceu. Produziu uma vintena de livros contendo pesquisas ou criação literária, mas é<br />

Vida, paixão e morte republicana de Don Ramón Fernández y Fernández a única obra<br />

relacionada com os imigrantes galegos. Não nos consta se algum imigrante galego ou se<br />

algumas das associações de galegos existentes em Salvador a finais da década de 1980 –<br />

Centro Recreativo União do Rio Tea, Clube Espanhol, Hospital Espanhol – divulgaram<br />

algum texto com a sua apreciação da novela de Nélson de Araújo, obra que, por ter a sua<br />

315

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!