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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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desejada, mas também é o único recurso logo da constatação de que a não-pertença<br />

restringe as possibilidades de obtenção do apoio dos enraizados, com legitimidade, na<br />

comunidade nacional. De fato, o direito à diferença e o sentimento de ser diferente não são<br />

recebidos pelo estrangeiro por ele possuir um talante especial ou uma cultura sem<br />

fronteiras, nem como conseqüência da sua insistência apaixonada. Estes direitos concedemse<br />

já que ele é o outro, em relação ao qual se decreta a tolerância do seu isolamento e da<br />

sua solidão.<br />

A combinação de indiferença e autonomia cria no estrangeiro um sentimento<br />

simultâneo de admiração (fascinação/ ódio) perante os outros – os naturais – e de<br />

prepotência (narcisismo ressentido), por ele se saber possuidor de chaves para a<br />

interpretação social das quais carecem esses outros – os nacionais em território nacional –<br />

devido à falta dos elementos para o contraste que fornece a experiência do distanciamento.<br />

Ora, a ampla perspectiva para a observação neutral dos campos sociais adquirida<br />

pelo estrangeiro através do distanciamento e do desligamento daquilo que o rodeia é estéril<br />

se não podem ser comunicadas as impressões das observações a interlocutores cúmplices<br />

que entendam a exposição sem se sentirem ofendidos por ela ou sem reagirem com<br />

anodinia perante o comunicado. Se esses interlocutores não aparecem, o observador está<br />

obrigado ao silêncio, com independência do estatuto que ocupe esse estrangeiro: imigrante,<br />

turista, asilado ou funcionário de uma empresa internacional. O estrangeiro impossibilitado<br />

para compartilhar, no espaço dos outros, a sua visão sobre os outros e sobre ele mesmo<br />

padece a mesma agonia de um jornalista dissimulado, correspondente em um país hostil e<br />

censor, com as comunicações com o exterior cortadas, que não pode remeter o seu discurso<br />

a periódicos fora das fronteiras do espaço em que ele faz as suas observações. Aos sujeitos<br />

dos campos sociais observados, esse jornalista não oferecerá crônicas, artigos ou<br />

reportagens que recolham a desconformidade ou o estranhamento ao seu respeito, a não ser<br />

que o que ele procure seja irritá-los e correr o risco de ser expulso. Mesmo que isso<br />

aconteça, perante os nativos a palavra do observador forâneo carecerá de verossimilhança,<br />

porque essa palavra, impedida de repercutir no exterior, ainda que pareça atraente,<br />

escandalosa ou rara, não tem nem o suficiente peso social nem o correlativo poder<br />

simbólico. E, caso haja outros jornalistas dissimulados, eles já sabem, sobre o observável,<br />

tanto quanto ele e, portanto, tudo o que ele enuncie carecerá de interesse e parecerá<br />

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