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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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Da perspectiva contrária, isto é, na observação da poesia do Brasil como objeto de<br />

interesse para pesquisadores espanhóis e do Brasil em si como fonte de elementos<br />

repertoriais na poesia espanhola, Pinto do Carmo (1959: 53) refere-se, em primeiro lugar, a<br />

Juan Valera como “o iniciador das primeiras apreciações acerca de nossas letras” durante o<br />

tempo em que ele residiu no Rio como secretário da legação espanhola; porém ele não<br />

Quixote e Carlito. Na Introdução a esse ensaio, Aníbal M. machado expusera: “Há um anarquismo<br />

fundamental na poesia cinegráfica de Carlito; em D. Quixote, a obsessão demente de um ideal a defender.<br />

Anarquismo e loucura de que tantas vezes resulta imprevista sabedoria. Quixote, mais asceta, mais puro,<br />

arremete contra a injustiça; Carlito, mais próximo de nós, mais dentro da realidade contemporânea, defendese<br />

das ofensas e procura o seu lugarzinho ao sol. Faz-se de cínico contra a vontade, e de acrobata por prazer e<br />

vocação; precisa alcançar o que deseja e proteger o seu sonho, que é uma busca permanente, mas sempre mal<br />

sucedida, de amor e liberdade. Enquanto o outro desagrava os oprimidos e injustiçados, Carlito desagrava-se a<br />

si mesmo de ofensas e ponta-pés. Ambos vivendo a mesma solidão. Um é o heroísmo e a candura em estado<br />

puro; o outro, a paródia burlesca da nobreza e da bravura, o homem-“clown” que desmascara os poderosos e<br />

tantas vezes se ilumina de piedade e lirismo, fazendo nascer uma flor do asfalto. Os moinhos de Quixote<br />

equivalem aos brutamontes de Carlito. Só que aqueles são fantasmas, e estes mais que monstros, porque<br />

revestidos de aparência humana”. O poema Canção para a Espanha é o seguinte: “Devemos cobrir-te de<br />

bênçãos – ó Espanha! –/ Porque fizeste o descobrimento/ Da figura mais bela, mais estranha/ E mais triste do<br />

mundo – o teu D. Quixote!/ Compondo-a com uma nuvem,/ A combater moinhos de vento,/ Sem que se<br />

humilhe com a derrota/ Ou amargue com o sofrimento!/ – Ó Espanha burlesca e arrebatada/ Dos romances da<br />

Cavalaria,/ De onde brotou aquele herói e poeta,/ Com a bravura impetuosa que avança,/ Na defesa de toda<br />

voz estrangulada,/ E cuja sombra em nossos dias se projeta,/ Perturbadora como a esperança!/ – Mágica<br />

Espanha, imensa e trágica,/ Da poderosa armada invencível/ De Felipe Segundo,/ Num vendaval<br />

despedaçada,/ Para quem a catástrofe terrível/ Somente fora possível,/ Porque construíra a armada contra o<br />

mundo/ E não contra os selvagens Elementos!/ – Ó Espanha latina e mourisca,/ Africana, sensual e mestiça,/<br />

De amplas arenas avermelhadas./ Mística e delirante,/ Das taciturnas procissões noturnas/ E da alegria<br />

tumultuosa das touradas!/ – Ó Espanha de belas e altivas mulheres/ Frementes da paixão que sangra como um<br />

corte,/ Em cuja boca há um sabor de cravo,/ Onde o amor, às vezes, respira morte,/ A navalha na liga e a<br />

música no sangue!/ Por isso – ó Espanha – através dos séculos,/ Hás de ser imutável e única/ No teu gênio e<br />

na vibração de tua raça,/ Na esperança, no orgulho e no desprezo,/ Namorando a quimera, porque é vã./ Com<br />

um olhar vigilante, sempre aceso,/ Para a Estrela da Manhã”.<br />

407 Pinto do Carmo (1960: 51-52) refere-se à obra Dimensões I – Crítica Literária de Eduardo Portela, editada<br />

em 1958. A partir dessa obra, Pinto do Carmo indica que a produção poética de Geir Campos se pode dividir<br />

em três períodos progressivos: o valeriano e estagiário, o espanhol, sob a influência temática de Salinas e<br />

Neruda e caracterizado pela “compreensão orteguiana” na estética, e o de compenetração entre os dois<br />

anteriores. De João Cabral de Melo Neto diz que é um “raciovitalista”, racionalista pela sua formação<br />

francesa, e vitalista pela sua condição de um nordestino que assumira “os valores culturais hispânicos” e que<br />

se integrara “na melhor tradição ibérica”, deixando-se influenciar, na literatura, pelas dimensões técnicoexpressivas<br />

do Cantar de Mio Cid. Pinto do Carmo menciona, além do mais, que os motivos espanhóis<br />

passaram a fazer parte da poesia de J. C. de Melo Neto como conseqüência da sua experiência e “andanças”<br />

na Espanha como diplomata. Isso é mostrado por Pinto do Carmo reproduzindo asa três últimas estrofes das<br />

oito que tinha o poema Imagem curta – Bailaora Andaluza quando foi publicado, aos 13 de julho de 1957, em<br />

O Estado de São Paulo: “Porém a imagem do fogo/ é num ponto desmentida:/ que o fogo não é capaz,/ como<br />

tu, na seguiriya,/ de arrancar-se de si mesmo/ numa primeira faísca,/ na chama que, quando queres,/ acende-te<br />

fibra a fibra,/ que tu somente és capaz/ de acender-se estando fria,/ de incendiar-se de dentro,/ de incendiar-se<br />

sozinha”. Há ambigüidade quando Pinto do Carmo (1960: 53) se refere ao papel desempenhado pela obra<br />

poética e teatral de Lorca como fonte de motivos espanhóis ou de elementos repertoriais para a literatura<br />

brasileira. Ele acredita que a enorme repercussão de Lorca no Brasil está relacionada com “certa paixão<br />

ideológica” surgida após o “infausto desaparecimento” de andaluz. De todas as formas, ele salienta que, em<br />

um tributo sem comparação no Brasil, muitos poemas foram escritos recordando o literato e a sua obra e que<br />

muitos dos seus poemas foram traduzidos e publicados “como homenagem especial”.<br />

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