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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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Aos 5 de abril, Fernando anota que Luiz passa as noites lendo nos grandes jornais as<br />

crônicas mundanas. Nas anotações desse dia, observa-se o primeiro indício da inflexão no<br />

modo de vida e no gosto de Fernando. Assim, escreve que, enquanto o seu amigo lia essas<br />

notícias, ele preferia palestrar na cozinha com as velhas, ouvindo contos e lendas “de<br />

pastores amantes e princesas mal casadas” e contando o que ele vira nas suas viagens, o<br />

qual deixava as velhas “em êxtase, como se lhes aparecesse o Espírito Santo” (Las Casas,<br />

1938: 112). O segundo momento de inflexão nas disposições do personagem observa-se nas<br />

anotações do 26 de abril, quando se refere a quem se tornará a sua esposa – a moça Maria<br />

José –, filha de um emigrante no México. Conhece-a na vila de Veiga, distante do paço,<br />

“pouco mais de uma hora”, até onde fora acompanhando uns rapazes que se iam lá<br />

encontrar com as suas namoradas:<br />

Passei duas ou três horas com uma moça muito linda que se chama Maria José, e em o pai em<br />

Veracruz. Não passa de dezessete anos e já parece uma mulher completa. No princípio nem se atrevia<br />

a olhar-me, e só se mostrou amável quando a convenci de que eu era o novo empregado da quinta de<br />

Názara. Então confiou plenamente e gozei as horas mais deliciosas e puras de minha vida (Las Casas,<br />

1938: 119).<br />

Dias após haver conhecido Maria José – o 8 de maio – e de havê-la beijado,<br />

registrando, aos 10 de maio, “Que deliciosos são os beijos quando não se compram! Foram<br />

rápidos, indecisos, nervosos. A pobre pequena ficou encabulada” (Las Casas, 1938: 125),<br />

Fernando redigirá um discurso em torno ao valor paradigmático que as moças populares<br />

aldeãs deveriam ter para as distintas damas urbanas. Ele crê que essas damas deviam<br />

observar os usos tradicionais das aldeãs e adotá-los como próprios para, por sua vez,<br />

projetá-los, canonizados, sobre as massas nacionais, pois neles se condensa o modo de ser<br />

diferencial que se deveria conservar para evitar a descaracterização que podem provocar os<br />

efeitos que exerça sobre essas massas o cosmopolitismo:<br />

As damas do grande mundo deviam ver essa maravilha, para sentirem a tentação de imitar as<br />

mocinhas serranas, e revalorizarem os antigos usos, na pompa e esplendor dos seus salões. A coisa<br />

seria de uma transcendência imensa, porque, digam o que quiserem, por mais que clamem os<br />

demagogos, as multidões fazem o que vêem fazer aqueles que, pelo sangue, inteligência ou poder, se<br />

intitulam aristocracia, segundo a nomenclatura grega. Não há povo capaz de manter incólume as suas<br />

virtudes, se a sua pequena elite se corrompe; não há possibilidade de anarquia e degradação, se o<br />

núcleo dos justamente destacados mantém com dignidade a sua primazia. Nas monarquias ancestrais,<br />

como nas modernas democracias, meia dúzia de famílias assinalam o rumo social, e porque estas,<br />

aqui e ali e mais além se estrangeirizam e desvirtuam no mais absurdo e insípido cosmopolistismo,<br />

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