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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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Segundo Kristeva, a resposta a esses questionamentos depende de como se<br />

interprete a noção de estrangeiro. Tal noção, além de ter que ser entendida desde a ordem<br />

jurídica e política, tem que ser entendida desde uma perspectiva psicológica em que se<br />

aprecie que a estranheza de um indivíduo faz também parte do âmbito privado e deve ser,<br />

portanto, submetida ao foro íntimo. Kristeva situa o miolo das suas reflexões na defesa do<br />

direito do estrangeiro a manter a sua singularidade, sem, para isso, estar obrigado a sofrer a<br />

marginalização ou a se ter que defender das tentativas da absorção e integração no país<br />

receptor.<br />

Kristeva acredita que a xenofobia – a não aceitação do estrangeiro – provém, por<br />

um lado, das crises das concepções universalistas religiosas e morais e, por outro, da<br />

subversão individualista e intransigente do homem moderno, a qual provoca ressentimento<br />

ao se quebrar a união no sistema social. Nesse sentido, ela sublinha que essa subversão fora<br />

paralela ao nacionalismo que acompanhou, desde o séc. XVIII, o romantismo das<br />

revoluções burguesas, já que esse nacionalismo, na sua vontade integradora, segregou, por<br />

sua vez, as estranhezas idiossincráticas do estrangeiro.<br />

Ela também aponta que, nos casos em que predomina o liberalismo e se celebra a<br />

hospitalidade para com o outro, o estrangeiro perceberá que a recepção entusiasta é frágil e<br />

que a acolhida é provisória, pois ele, como outro, acabará tendo que se restringir ao espaço<br />

reservado e às funções destinadas, da legalidade e da administração, para os errantes. Do<br />

liberalismo, surge a cumplicidade entre os naturais e os outros, mas trata-se de uma<br />

cumplicidade submetida ao controle recíproco e à suspeição, a fim de se evitar que o<br />

contingente de estrangeiros acabe se assenhoreando, como intruso ou invasor, de um espaço<br />

que não está legitimado a possuir. Quando a presença desse outro no tecido social – de um<br />

outro concorrente, embora débil, ou mesmo um dejeto – é sopesada desde posições isentas<br />

de xenofobia, e com resignação devido à sua inevitabilidade dessa presença, alguns<br />

observadores julgam que a aceitação dela deve ser guiada pela tolerância, porém, na<br />

opinião de Kristeva, isso acontece com pouca humildade e nenhuma generosidade. A<br />

aceitação impõe-se, mas esta consiste em uma acolhida ajustada pela desconfiança, e<br />

organizada, de todas as formas, com base no orgulho nacional. Dessa dúbia aceitação, com<br />

lindes fixados sobre o desprezo e o temor, pode surgir, a qualquer momento, a fúria contra<br />

o estrangeiro, porque os liberais têm em mira a solidificação da nação.<br />

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