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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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atingiriam os Pirineus apesar do apoio da URSS e da França à II República. Após o passeio<br />

por Valencia, Soares volta a embarcar poucas horas antes de o Urania partir rumo a<br />

Barcelona, cidade em que também desce e sobre a qual também elabora uns apontamentos<br />

sobre a destruição e o caos da cidade, sobre a presença de milicianos por todas as partes e<br />

sobre o arrasamento de conventos e de templos junto ao assassinato dos seus religiosos. Em<br />

Barcelona, ele resulta ferido em um braço por uma bala perdida, fato que ele considerou o<br />

seu “batismo de fogo”; lá foi ao encontro do vice-cônsul do Brasil, Alfredo dos Santos<br />

Couceiro, a quem encontrou apavorado e prestes a abandonar a cidade. Esse vice-cônsul<br />

fez-lhe a seguinte justificativa da sua partida e resume-lhe a situação em que se encontra a<br />

cidade:<br />

– Tenho autorização do governo para deixar Barcelona. O Daltro foi para Marselha. Eu tomo o<br />

último vapor que me resta, “Principessa Giovanna”, que deve zarpar hoje para Gênova. Tranquei o<br />

consulado e levo comigo arquivo e código. Isto aqui está infernal. Sabe que às mulheres deu agora<br />

por castrarem os padres? E rivalizam, essas diabas, quanto ao maior número de vítimas. Há mesmo<br />

algumas que fazem coleção das provas do seu ato diabólico. Meu amigo, desculpe se não o posso<br />

atender. Deseja alguma coisa? Entenda-se com o consulado português, a quem ficam desde agora<br />

confiados os interesses do Brasil em Barcelona. O Cruz – coitado do Cruz! – que ia tão bem com os<br />

seus dois cafés, que estava prosperando a olhos vistos, perdeu tudo, arrasaram-lhe tudo e regressa<br />

agora ao Brasil sem peseta no bolso. Sabe que temos quatrocentos brasileiros estabelecidos em<br />

Barcelona? Bem, desculpe e adeus. Vou a minha casa buscar o bispo.<br />

– O bispo? Que bispo?<br />

– Pois não sabe que estava em Barcelona um bispo brasileiro? Queimaram-lhe a casa, profanaramlhe<br />

a capela, roubaram-lhe anel e cruz peitoral, deixaram-no de pijama e de pijama o jogaram à rua.<br />

O pobre coitado veio asilar-se em minha casa, assim mesmo como o deixaram, de pijama, e que dê<br />

graças a Deus porque o não fuzilaram ali mesmo (Soares d’Azevedo, 1936: 159-60).<br />

Sobre Barcelona – a cidade “transformada em verdadeira praça de guerra” – Soares<br />

redige uns sumários apontamentos dramáticos quando, logo de reembarcar e ao se<br />

distanciar do porto o navio, percebe como vai ficando difusa a imagem da cidade:<br />

Deixo Barcelona à tardinha. A cidade vai sumindo, mergulhado em bruma. Dos canos das fábricas<br />

não saem rolos de fumo. O porto das fábricas está paralisado. Parece-me que toda aquela mole de<br />

casas são milhões de barricas de pólvora aguardando o sinal trágico da Federação Anárquica Ibérica,<br />

para que em dois minutos salte pelos ares a jóia da Catalunha, saltem pelos ares vinte séculos de fé<br />

cristã.<br />

Deixo a Espanha. Da popa do Urania atiro um olhar de despedida a essa terra cheia de glórias,<br />

exemplo e ufania do mundo cristão, agora retalhada, empapuçada de sangue, em agonia.<br />

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