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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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uma poltrona e uma biblioteca com cinqüenta livros, entre os quais estariam “as poesias” de<br />

Rosalia de Castro 577 ; a sala de jantar seria simples, “de uma simplicidade franciscana, para<br />

que não destoem o caldo verde, o pão de milho, as laranjas acedas e as flores silvestres que<br />

sempre cobrirão a toalha, e sempre terei talheres dispostos para os viajeiros que batam na<br />

minha porta” (Las Casas, 1938: 146), e o dormitório seria o seu “santuário”, onde reuniria<br />

os objetos simbólicos que guardara das suas viagens pelo mundo. O deleite de Fernando ao<br />

imaginar o seu recolhimento em um modo de vida austero, junto a Maria José, na casa<br />

solarenga familiar no interior da Galiza é acompanhado pela convicção, expressa aos 28 de<br />

agosto (Las Casas, 1938: 161-62), da benesse inerente à conservação das tradições. Essa<br />

convicção faz com que Fernando defenda, inclusive, a reação perante o progresso extremo<br />

porque acredita que se o homem recuperasse os usos do passado poderia ser mais feliz:<br />

Seríamos muito mais felizes se a humanidade fizesse um alto na sua carreira vertiginosa, e<br />

principiássemos a caminhar para trás. Que bom se voltássemos de pronto aos coches de cavalos, aos<br />

lampiões, às sobrecasacas, às cartolas, às caixas de música, ao cinema mudo, quando ainda era<br />

lanterna mágica!<br />

Pela primeira vez usei hoje o rico relógio de meu avô, preso numa grande corrente de ouro que me<br />

cruza o peito; estou contente como uma criança com sapatos novos.<br />

– Pareces um velho – disse-me Luiz. – Só os velhos usam relógios com corrente.<br />

– Pareço um velho, sou um velho, e... louvado seja Deus! Estou cansado de aparentar juventude. Mas<br />

não te assustes: a verdade faz-me muito mais forte (Las Casas, 1938: 161-62).<br />

A meados do mês de julho, a decisão de contrair casamento por parte de Fernando e<br />

de Luiz e apresentada como definitiva. Aos 18 de julho (Las Casas, 1938: 157-58),<br />

Fernando contrasta no diário a visão divergente que ele e o seu amigo têm acerca do<br />

matrimônio. Escreve que, para ele, o casamento é “uma esperança de recolhimento”, uma<br />

esperança de restituição da “calam esquecida”, enquanto que, para Luiz, é “um motivo<br />

social” e uma conseqüência do “anseio de saciar gozos nunca vistos”. Fernando plasma<br />

essa oposição reproduzindo um diálogo mantido entre ambos, no qual se frisa a sua vontade<br />

de se afastar da sua pretérita vida errante de cosmopolita e de se isolar no seu sítio<br />

577 Os títulos mencionados para constar na biblioteca da quinta de Trasdeza, além das “poesias” de Rosalia de<br />

Castro, são: “os Evangelhos, O Kempis, Só de Antônio Nobre, o Quixote, [...] os Anos decisivos de Spengler,<br />

as Minhas prisões de Sílvio Pelico, Del sentimiento trágico de la vida, de Unamuno, Os heróis de Carlyle, As<br />

vidas paralelas, de Plutarco, o Hamlet...” (Las Casas, 1938: 146).<br />

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