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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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Em Emigrantes, o protagonista manifesta a sua contrariedade por ter que assumir<br />

um posto de trabalho – o de camponês – que, nas suas cogitações, não lhe poderia render a<br />

quantidade de benefícios calculada para um breve prazo de tempo:<br />

– E o senhor vai?<br />

– Eu? Não faltava mais nada do que vir ao Brasil para agarrar à enxada! [...]<br />

– Vem recomendado a alguém?<br />

– Eu venho ter com um rapaz da minha terra.<br />

O inspector volveu-se para a mesa, a reunir os papéis. E Manuel da Bouça ficou a ruminar o diálogo.<br />

“Estavam caçoando com ele... Vir ganhar no Brasil cento e cinquenta mil réis por mês! Assim,<br />

quando voltaria a Portugal?” (Castro, [1928] 1954: 122).<br />

Nesse trecho observa-se que não eram coincidentes o trabalho reservado pelas<br />

autoridades para um imigrante e a ocupação almejada por esse emigrante com vistas ao<br />

enriquecimento rápido. A contradição consiste na relutância de um camponês, o<br />

protagonista Manuel da Bouça, para trabalhar na lavoura no Brasil. Ele, apesar do seu<br />

despreparo para o desempenho de profissões urbanas, era consciente de que o trabalho rural<br />

não lhe renderia o salário desejado. Portanto, durante a sua estada no Brasil, ele deveria<br />

adotar a impostura de se propor candidato para labutar na cidade por achar que só obteria<br />

lucro em um ofício urbano. A atitude de Manuel da Bouça representa o paradigma de<br />

muitos camponeses chegados ao Brasil. Eles abandonavam o trabalho reservado nas<br />

fazendas aos imigrantes, já que eram conscientes de que a ascensão social pretendida não se<br />

poderia encontrar no modo de vida que os fizera sair da sua pátria. Se essa mudança lhes<br />

fosse vedada, só lhes ficaria a alternativa de se conformarem e se empenharem na profissão<br />

rural para investirem os ganhos na educação da sua descendência.<br />

Eis uma grande diferença entre a imigração no Brasil e a imigração magrebina e<br />

turca estudadas em A imigração ou os paradoxos da alteridade. Sayad assinala que a<br />

emigração reproduz as relações características da situação colonial. A emigração é, como a<br />

colonização, “o lugar e a oportunidade mais favoráveis à relação de força que engendrou<br />

essas reações, a saber, a relação (desigual) entre, por um lado, uma sociedade, uma<br />

economia, uma cultura dominante e, por outro, uma sociedade, uma economia, uma cultura<br />

dominadas” (Sayad, 1998: 230).<br />

No caso do Brasil, e dos países americanos que demandaram mão-de-obra européia,<br />

não se pode projetar a mesma estrutura de dominação destacada por Sayad para a diacronia<br />

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