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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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Estima [o criado] muito que eu lhe fale e adivinho que sente por Luiz uma estima profunda,<br />

entranhável. O meu amigo nunca me falou dele e até parece que o esconde de mim. Por que? Haverá<br />

qualquer relação misteriosa entre os dois? Não acredito; ainda não acredito (Las Casas, 1938: 74).<br />

Fernando reproduz, aos 27 de janeiro (Las Casas, 1938: 96-98), o diálogo que<br />

mantivera com Luiz tentando convencer esse seu amigo de que o acompanhasse em viagens<br />

“por esses mundos afora” para se civilizar “um pouco mais” – Berlim, Trieste, Sicília –.<br />

Comenta-lhe que poderiam levar consigo “Joãozinho” – “um rapaz lindo, amável,<br />

prestimoso” – apresentando-o como um sobrinho, pois “na Europa ninguém se importa com<br />

intimidades mais ou menos dramáticas; o problema está em cobrir as aparências, em dar<br />

uma justificação qualquer, em poder explicar as coisas com desculpas toleráveis. Mais<br />

nada”. No entanto, Luiz confessa a Fernando que, embora ele ame o criado, não o ama<br />

eroticamente: “Quero-lhe, sim, como a uma noiva, como a um pai. Não sei! Não quero<br />

saber. Só a ele, e a ninguém mais, devo nestes últimos anos da minha vida uma ternura<br />

verdadeira. Do resto...”, ao qual Fernando responde: “Basta, basta; eu compreendo”.<br />

Fernando apresenta-se, inicialmente, como um homem heterossexual que se crê bem<br />

resolvido afetiva e sexualmente, mas que permite que o seu amigo o toque e que lhe mostre<br />

a sua paixão contida enquanto não supere as suas carências e a conseqüente repressão, fruto<br />

da sua educação materna excessivamente protetora. Assim, Fernando, nesse mesmo dia –<br />

11 de dezembro –, escreve o seguinte sobre o seu amigo, quem deposita nele a esperança da<br />

sua libertação por meio do aprendizado tanto do talante culto, fresco e cosmopolita quanto<br />

dos bastos conhecimentos dos que acredita que Fernando é possuidor:<br />

A sua debilidade de carnes e de espírito, a sua falta de saúde, a sua constante preocupação de uma<br />

morte prematura, fazem que se prenda à vida com ardor, sem controle. Tem fome de um amor sem<br />

confins. Ama, ama tudo, e porque nunca foi amado – as ternuras de sua mãe eram simples proteções<br />

– arde por prender-se a um afeto que possa recolher as suas sempre contidas exuberâncias. As suas<br />

mãos tremem apaixonadas quando acariciam o gato ou os cachorros, os seu lábios beijam mais do<br />

que silvam quando brinca com os pássaros imitando seus gorjeios, a sua voz arrulha com as pombas<br />

quando pode dialogar numa longínqua esperança de ser entendido.<br />

Pobre Luiz! Hoje estivemos no jardim até à meia noite, abrigados no orvalho num recanto<br />

profundamente escuro e acolhedor. Senti suas mãos entre as minhas, seus olhos nos meus olhos, seu<br />

arfar roçando-me no ouvido, e sobre o meu peito todo o seu tremer febril e convulso. Era feliz assim,<br />

e julgo que não gostaria de passar além (Las Casas, 1938: 59).<br />

Fernando decide repassar os seus conhecimentos a Luiz. Fala-lhe, então, da cultura,<br />

sobretudo da literatura, do “mundo clássico”, o qual repercute positivamente em Luiz e faz<br />

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