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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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Essas confusões conduziram alguns pesquisadores a indagar sobre os reflexos<br />

semânticos que teve a introdução no Brasil do real indivíduo galego. Em um dos quatro<br />

cadernos redigidos por Castelao entre 1938 e 1947 – o Caderno B –, constam os resultados<br />

dos estudos por ele realizados sobre as causas de todos os imigrantes da Hespanha Sul<br />

receberem, na América do, o apelido de gallegos (Castelao, 1992: 928-29) 130 . Castelao<br />

pondera que os espanhóis assentados na região do Prata eram chamados “galegos” pelos<br />

criollos – filhos dos moçárabes hispânicos – como conseqüência da recuperação natural, e<br />

da perpetuação, do alcunho que seus pais, sob o poder sarraceno, deram aos cristãos livres<br />

durante o longo período da Reconquista. O intelectual galeguista expõe que o uso que<br />

faziam os brasileiros do termo “galego” para qualificar todos os reinóis derivou da ancestral<br />

aversão que sentiram os portugueses da terra de mouros – antepassados dos brasileiros –<br />

contra os bracarenses, alcunhados de galegos, e, em geral, “contra o Norte de Portugal, ou<br />

sexa, contra Galiza” (Castelao, 1992: 929) 131 . Assim, Castelao repara em que:<br />

130 Esses cadernos manuscritos, anexados à edição crítica de Sempre en Galiza, foram localizados pela equipe<br />

de investigadores de Co Pensamento en Galiza no acervo custodiado na Biblioteca da Fundación Penzol.<br />

Conforme indicam os editores, o conteúdo das anotações dos cadernos corresponde a reflexões sobre as<br />

leituras que Castelao fazia, a apontamentos de viagem ou a apontamentos literários e a idéias para discursos<br />

ou artigos.<br />

131 Ao contrário do posicionamento de Castelao, preconceituoso contra moçárabes e mouros hispânicos, a<br />

relação especial entre a brasilidade e o substrato mouro foi, desde finais do séc. XIX, reexaminada<br />

positivamente no empenho em definir a etnicidade nacional. Com anterioridade às reflexões historiográficas,<br />

José de Alencar inserira uma alusão à herança cultural hispano-árabe no Brasil em um episódio de O Guarani<br />

(Alencar, [1857] 1999); nele o índio Peri dedica uma canção à filha de um fidalgo português. O conteúdo<br />

dessa canção faz referência aos amores entre um infanção mouro e uma castelã cristã. Dentre os ensaístas, o<br />

poeta e crítico literário Manoelito de Ornellas, ao estudar a gênese do gaúcho sul-americano, isto é, do<br />

mestiço autóctone de ambas as margens do Plata, expôs em duas obras de retórica iberista que na<br />

ascendência étnica do gaúcho – a miscigenação do peninsular com a índia – havia influência indireta de um<br />

substrato árabe. Em sua obra Gaúchos e beduínos: a origem étnica e a formação social do Rio Grande do Sul<br />

([1948] 1956b), Ornellas assinala que era evidente que as raízes dos atuais habitantes do Sul do Brasil se<br />

encontravam na África do Norte. Essa tese foi de novo sustentada em A gênese do gaúcho brasileiro (1956a),<br />

ensaio no qual, baseando-se, sobretudo, em Gilberto Freyre e Oliveira Martins, Ornellas assinala que o<br />

elemento mourisco, ou moçárabe, lusitano teria chegado ao Brasil através dos conquistadores e colonos<br />

procedentes do Algarve e das ilhas atlânticas portuguesas, espaços com notável influência da civilização<br />

islâmica. Pela parte da contribuição espanhola, os indícios dessa herança árabe – poesia dos Pampas,<br />

costumes, vestido, gastronomia, nomadismo – teriam sido depositados na região do Plata pelos maragatos<br />

castelhanos, herdeiros dos berberes. Ornellas (1956a: 27) indica a História da Literatura de Teófilo Braga<br />

(não especifica o volume ao qual se refere) como obra em que se salienta que a “raça portuguesa”,<br />

etnologicamente, é “a resultante de um caldeamento molecular de diversas outras raças”. Lesser (2000: 89-90)<br />

aponta outro livro de Braga, A Pátria Portugueza (Braga, 1894), como uma importante fonte para a<br />

formulação de que a afinidade biológica dos peninsulares com os árabes provava que os portugueses que<br />

colonizaram o Brasil estavam arabizados. Por sua vez, voltando os olhos para Portugal em busca de autocompreensão,<br />

Luís da Câmara Cascudo (1967: 17-52) procurou traços da presença moura na identidade do<br />

Brasil, estabelecendo um elo árabe-português-moçárabe-tupi-brasileiro.<br />

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