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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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O interesse dessas informações, dentro da visão tendenciosa do autor e do<br />

engajamento do livro, reside em que, dado que foram publicadas ainda em 1936,<br />

proporcionavam aos potenciais consumidores da obra um conjunto de relatórios e crônicas<br />

elaborado por um espectador brasileiro in loco. Assim, com data de 24 de julho, compôs<br />

uma longa crônica que constitui o terceiro capítulo do livro, com o título Ordem e<br />

desordem, a partir da sua observação do equilíbrio alcançado entre as forças enfrentadas.<br />

Nesse discurso, compara a gravidade e a violência do enfrentamento na Espanha com as<br />

revoltas brasileiras das três primeiras décadas do séc. XX que ele acompanhara como<br />

jornalista:<br />

Agora, sim, estou mais a cavaleiro da situação, que se torna clara. Até aqui, venho jogando ao papel<br />

impressões desordenadas, que estou captando como posso, entre a rua e os salões luxuosos da<br />

embaixada, numa indescritível tensão de nervos. Assisti à revolta chefiada por João Candido, da<br />

praça 15 de Novembro, já se vão vinte e seis anos. Assisti a várias outras e tive conhecimento muito<br />

exato da do general Isidoro, em São Paulo, sendo também testemunha presencial da de novembro do<br />

ano passado, deflagrada na Praia Vermelha. Posso dizer agora que todas as revoluções no Brasil, a<br />

que tenho assistido ou de que tenho tomado conhecimento mais íntimo, são brincadeira de criança,<br />

em presença desta hedionda e atroz guerra civil, a de maior envergadura de que reza a história<br />

(Soares d’Azevedo, 1936: 42).<br />

A seis dias do estouro da revolução, a Soares causa-lhe espanto a presença de<br />

mulheres e de adolescentes nas milícias e a supressão da hierarquia nas tropas republicanas<br />

nas quais os “oficiais não são autoridade, são ‘companheiros’. Ninguém os acata. Quem<br />

comanda esses infelizes é o fanatismo” 354 . Acredita que, caso a República derrote os<br />

afim de contrabalançarem a ideologia conservadora da Guardia Republicana, que passa por ser uma das mais<br />

eficientes organizações militares da Europa. Sabe-se igualmente que o governo não tem mais comunicações<br />

com Portugal, porque as regiões fronteiriças acham-se todas em poder dos sublevados, desde a Galiza,<br />

passando por Salamanca e Medina del Campo, Soria e Ávila, Badajós (que está convulsionada), Huelva,<br />

Cadix. Sou ainda positivamente informado de que estão cortadas as comunicações para o norte, por<br />

Barcelona, porque Saragoça se acha em poder dos sublevados. A linha para Alicante, Cartagena e Valencia,<br />

igualmente cortada, porque Albacete caiu em poder das forças insurretas do exército. Isto quer dizer que<br />

Madrid se acha inteiramente isolada do resto do mundo”.<br />

354 Soares d’Azevedo (1936: 72) mesmo acredita que o que ele observa é um espetáculo dantesco (“É infernal.<br />

Parece o fim do mundo”). Apavora-o o que ele julga como o aspecto esfarrapado e a atitude animalesca das<br />

milícias republicanas em contraste com a disciplina marcial das tropas nacionalistas e observa em ambos os<br />

bandos a mesma crueldade no modo de proceder com os inimigos na retaguarda e com os prisioneiros de<br />

guerra: “Vivem [os milicianos] estropiados, imundos, muitos deles descalços, uma barba imensa, semelhando<br />

antes evadidos de galés. Quando lhes anunciam o rancho lançam-se sobre ele com uma sofreguidão de<br />

esfaimados de muitos dias. O governo manda-lhes o que os comunistas e anarquistas roubaram das casas<br />

comerciais de Madrid: chouriços, pão de ló, ‘paté de foie gras’, até garrafas de champagne. É o que puderam<br />

apanhar na ocasião. Vi um miliciano comer um grande naco de presunto acompanhado de uma garrafa de<br />

‘Veuve Cliquot’; um outro misturando pudim com sardinhas em lata... De quatro em quatro dias, revezam-se<br />

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