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UNIVERSIDADE DE SANTIAGO DE COMPOSTELA FACULDADE ...

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apoio Embaixada da Espanha no Brasil, da Agência Espanhola de Cooperação<br />

Internacional e, logo, do Centro Cultural Brasil-Espanha de Belo Horizonte. Trata-se de um<br />

Espanha – coordenada por Washinton Goularte (1996) – , do projeto Orvalho Andaluz Editora, que reuniu<br />

poemas de 21 autores brasileiros – entre eles o belo-horizontino Affonso Romano de Sant’anna –, os quais<br />

plasmaram em seus versos a sua compreensão de elementos repertoriais de cultura espanhola; o poema Mar<br />

de Vigo, fazendo parte de Nômada de Rodrigo Garcia Lopes (2004: 99) e os poemas ao redor da tauromaquia<br />

e da cultura flamenca de Por Espanha (1987-2005), da autoria de Couto Corrêa Filho (2006), que receberam<br />

em 2004 o Prêmio Sousândrade do XXVIII Concurso Literário e Artístico da Cidade de São Luís-MA. No<br />

ensaio destacamos o capítulo Dias de Hespanha do livro de Nilo Peçanha, Impressões da Europa, em que se<br />

incluem algumas ponderações sobre a emigração dos espanhóis ao Brasil e os Cadernos de Portugal e de<br />

Espanha, do gaúcho Manoelito de Ornellas (1954). Achamos que Se um viajante numa Espanha de Lorca, de<br />

Antonio Naud Júnior (2005), é o primeiro livro publicado no Brasil em que um autor brasileiro, neste caso um<br />

baiano, refere-se à Espanha da perspectiva de um imigrante brasileiro nesse país. O livro é um pequeno<br />

conjunto, miscelâneo, de crônicas, de anotações de impressões de viagens, narrativas de um suposto diário,<br />

ensaios, artigos de opinião e fotografias em preto-e-branco unido pela perspectiva de um autor que assume<br />

uma dupla posição. Por um lado, ele é um imigrante brasileiro de variados ofícios – barman, cozinheiro,<br />

tradutor, modelo de escolas de Belas Artes, colhedor de frutas, jardineiro – residente na Espanha; por outro,<br />

ele investe uma parte do seu tempo em conhecer a Espanha – um “belo, místico e acolhedor país” (Naud<br />

Júnior, 2005: 17) –, sobretudo a Catalunha e Andaluzia, e Marrocos, através de viagens que recolhe em<br />

narrativas nas quais se misturam a olhada do repórter com a olhada do turista deliberadamente reflexivo.<br />

Dedica o capítulo intitulado A morte de um Amor não é Menos Triste que a Morte, datado em setembro de<br />

2004 em Tarifa, ao Caminho de Santiago. Menciona que estivera duas vezes em Compostela, mas não se<br />

refere à cidade, e, após descrever diversas atitudes e finalidades dos peregrinos, explica por que ele nunca fez<br />

esse caminho: “O meu caminho são as palavras escritas, palavras que falam da perplexidade humana diante<br />

do vazio e da solidão de todos nós” (Naud Júnior, 2005: 62). O livro contém uma narração em que se<br />

descreve uma reunião festiva de brasileiros residentes na Espanha que, acreditamos, deve ser um dos<br />

primeiros relatos com esse assunto escrito por um brasileiro e publicado no Brasil. Eis: “Os cerca de quarenta<br />

convidados dançavam, bebiam, comiam e lembravam saudosamente do Brasil. Todos jovens, educados, de<br />

diversas partes do nosso imenso país, do Ceará ao Tocantins, de Minas Gerais ao Rio Grande do Sul. Entre<br />

chamar um táxi, ir para casa, e continuar bebendo, falando frivolidades com estranhos, acatei a segunda<br />

opção. Tarde na madrugada, ouvindo de um moreno gaúcho algo a respeito das saudades que sentia pela filha<br />

distante, éramos interrompidos a curtos intervalos pelo timbre histérico do seu celular. Não me controlei,<br />

perguntando: ‘Não vai atender?’. ‘Não trabalho esta noite’, respondeu com um sorriso malandro. Então<br />

percebi que muitos outros celulares tocaram infernalmente toda a noite. Melodias de Carlinhos Brown,<br />

Mozart; até do nosso Hino. O gaúcho, sem qualquer curiosidade ou incentivo de minha parte, confessou pagar<br />

as suas contas como garoto de programa, não só ele, como mais da metade das meninas e meninos presentes.<br />

Alguns trabalham em saunas, outros em bordéis e a maioria coloca anúncios em jornais, ensinou-me. ‘Somos<br />

formados ou universitários, classe média, gente fina no Brasil’, ironizou, creio. Fiquei imaginando os seus<br />

pais, esposas, filhos, amigos, irmãos, sei lá o quê, acreditando que ganham dinheiro como garçons ou coisa<br />

parecida. E os patrícios vendendo o corpo. Um exército de meretrizes tropicais! Depois indignam-se com a<br />

idéia gringa de que o Brasil é a terra de putas, bandidos e jogadores de futebol. Será que no futuro contarão<br />

aos netos suas peripécias eróticas de juventude? Não creio, nem todo o mundo tem a honestidade verbal de<br />

um Gerald Thomas. ‘Se estiver interessado em trabalhar numa sauna, avise-me. Não é complicado. Basta ficar<br />

esperando, se possível excitado, e logo surge um cliente. Dependendo o que ele quer, varia o preço. Não tarda<br />

mais de 15 minutos e, na hora, o truque é pensar na mulher amada’, disse. Este jovem advogado recém<br />

formado, belo como um modelo, casado, pai de uma garotinha de quatro anos, veio à Europa para juntar<br />

dinheiro e voltar o mais rápido possível. Está sozinho em Barcelona há dois anos, não juntou um euro, não<br />

sabe quando poderá regressar. ‘o que farei no Brasil?’, perguntou, concluindo: ‘Aqui pelos menos tenho uma<br />

vida confortável, posso também enviar uma boa mesada para a minha mulher e a minha filhinha. Muitos<br />

gostariam de estar no meu lugar’. Uma vida confortável. Foi isso mesmo o que ouvi. O mundo está mesmo<br />

louco. Voltei para casa, acariciando livros e pensando com nostalgia na minha biblioteca baiana” (Antonio<br />

Naud, 2005: 88-90).<br />

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